Santos Dumont: o supercomputador que quer fazer a ciência brasileira voar

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Petrópolis, cidade na serra do Rio de Janeiro, guarda uma das grandes joias da ciência brasileira. Seu grande chapéu amarelo chama a atenção de quem passa de carro pela avenida Getúlio Vargas. É o supercomputador Santos Dumont.

Sob cuidados do Laboratório Nacional de Computação Científica, o LNCC, a máquina está entre as 6 brasileiras que figuram no Top500 mundial, ranking que avalia o poder de processamento de supercomputadores.

O supercomputador brasileiro

A ideia de hospedar um supercomputador no Brasil não é nova. Segundo o pesquisador do LNCC, Wagner Leo, ela existe desde a década de 1970 e persistiu por muitos anos. Na década de 1990, o país recebeu a doação de um modelo 3090 da IBM.

Foi nessa ocasião que o laboratório se transferiu para a localização em Petrópolis, onde poderia acomodar melhor a infraestrutura necessária para a máquina. Mas o tempo passou depressa e a tecnologia evoluiu, deixando o antigo 3090 obsoleto.

Foi em 2014, através de um projeto de R$ 60 milhões do Ministério de Ciência e Tecnologia, que o sonho antigo pode ser realizado. O Santos Dumont foi negociado junto com a empresa francesa ATOS/BULL e hoje atua como o nó central do Sistema Nacional de Processamento de Alto Desempenho. Foi o primeiro computador do país a atuar em petaescala (capacidade de realizar mais de 10¹5 operações por segundo).

Na serra fluminense, Petrópolis guarda um dos maiores supercomputadores brasileiros (Fonte: Wikimedia Commons)Na serra fluminense, Petrópolis guarda um dos maiores supercomputadores brasileiros (Fonte: Wikimedia Commons)Fonte:  Wikimedia 

Em 2019, a Petrobras, através do consórcio Libra, fez um aporte de 50 milhões para fazer a atualização e expansão que ampliou em 5 vezes a sua capacidade. Hoje ele figura na posição 426 entre as maiores máquinas do mundo.

São 5,1 petaflops de capacidade instalada, com arquitetura de processamento paralelo em configuração híbrida de nós computacionais e mais de 36 mil núcleos de CPU, a maioria de modelo multi-core.

Por que o supercomputador Santos Dumont tem esse nome?

Wagner Leo, coordenador de tecnologia da informação do LNCC, conta que os pesquisadores diziam que o novo supercomputador era um avião, ia decolar. Por isso o nome inicial escolhido para a máquina foi 14 Bis.

Mas os fabricantes advertiram que o uso de algarismos numéricos poderia dar problemas de incompatibilidade nas licenças de softwares no futuro, e os pesquisadores chegaram então ao nome de Santos Dumont, em homenagem ao inventor brasileiro conhecido como o pai da aviação.

"No dia da inauguração, no primeiro semestre de 2015, na França, seria feita a entrega do equipamento, e os engenheiros colocaram o nome genérico de Felix na máquina", conta Leo. "Eu falei que a máquina tinha nome, chamava Santos Dumont e foi uma grande alegria, porque foi uma homenagem, não só ao Brasil, mas também para os franceses."

Infraestrutura de peso

O Santos Dumont pesa 60 toneladas. Wagner explica que o financiamento de um supercomputador não é apenas para sua aquisição. É necessário construir uma infraestrutura capaz de suportar o aparelho.

Um computador desse tamanho precisa ser refrigerado a água, às vezes de dois tipos, na temperatura ambiente e gelada. No LNCC existem ainda três geradores, de 750 kVA cada um, e cinco no-breaks de 350kVA para poder suportar o equipamento.

A obra toda do Santos Dumont incluiu projeto, construção de subestação, no-breaks, geradores, torres de água, refrigeração, base para suportar e o icônico chapéu sobre ele, uma referência ao inventor que lhe dá nome.

A instalação do Santos Dumont exige uma superestrutura (Fonte: LNCC/reprodução)A instalação do Santos Dumont exige uma superestrutura (Fonte: LNCC/reprodução)Fonte:  LNCC 

Além disso, existem os custos recorrentes. Segundo o coordenador, mensalmente são gastos mais de R$ 650 mil no Santos Dumont, grande parte com a manutenção do supercomputador em si.

Santos Dumont é um salto para a ciência brasileira

Antonio Tadeu Gomes é coordenador do setor de pesquisa do LNCC.  Ele, que teve a oportunidade de ser um dos primeiros usuários do supercomputador, afirma que a experiência foi fascinante.

"Desde que tive acesso ao Santos Dumont, a minha perspectiva do que é uma computação em larga escala mudou completamente", diz. "Não havia nada parecido no Brasil até 2015". Hoje são 300 projetos provenientes de 16 estados do país rodando no aparelho.

As áreas de ciência dos materiais e saúde são as duas das que mais utilizam o supercomputador e têm um número enorme de aplicações, desde o desenvolvimento de vacinas, antibióticos e outros medicamentos, até compostos com propriedades de interesse industrial como resistência e transparência.

Pesquisas que permitiram o desenvolvimento de vacinas foram feitas no Santos Dumont (Fonte: Unplash/CDC)Pesquisas que permitiram o desenvolvimento de vacinas foram feitas no Santos Dumont (Fonte: Unplash/CDC)Fonte:  Unplash 

Uma das descobertas mais marcantes que envolveu o Santos Dumont foi a da vacina experimental contra o vírus da Zika, em 2018. O trabalho identificou uma sequência de proteína específica do vírus, que permitiu o desenvolvimento dos imunizantes que ainda estão em testes.

Em 2020, o supercomputador se dedicou quase exclusivamente à pesquisa da covid-19. Descobertas feitas incluem a identificação do início da circulação das variantes Gamma, Zeta e Delta no país e um caso de infecção de um paciente por duas variantes recombinadas.

Projetos para pesquisas de caráter mais fundamental, como astronomia, astrofísica e física de altas energias, também estão rodando nos núcleos da máquina.

Tadeu Gomes também conta que, como um dos responsáveis pela gestão, passou a olhar detalhes de operação que não considerava antes, mas que são críticos para uma instalação do porte do Santos Dumont.

Para ele, isso é um indicativo de que o Brasil precisa olhar com mais carinho para a supercomputação, porque além do ponto de vista científico, ela também é relevante para a formação dos cientistas brasileiros.

Fontes

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