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Ciência

O que é pseudociência e como ela pode prejudicar sua saúde

No Brasil, práticas sem comprovação científica são usadas no SUS; mal uso do dinheiro público e atraso de diagnósticos e tratamentos estão entre consequências

schedule30/01/2023, às 12:00

O que é pseudociência e como ela pode prejudicar sua saúdeFonte:  Shutterstock 

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Durante a pandemia de covid-19, inúmeras práticas sem comprovação científica foram usadas no combate à doença. O uso de ivermectina e cloroquina foi recomendado até mesmo por profissionais da saúde, se apoiando em uma mistura de ciência malfeita, fraude científica e pseudociência.

Mas essas práticas estão presentes na saúde pública desde muito antes da pandemia. A integração de pseudociências como homeopatia e constelação familiar no SUS (Sistema Único de Saúde) foi aprovada pelo Ministério da Saúde em 2006, apesar da falta de apoio da comunidade científica.

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Isto porque tais práticas não são efetivamente baseadas na ciência —apesar de tentarem se parecer com ela. “São iniciativas que usam a linguagem da ciência, querem mostrar publicações científicas, jargões científicos, especialistas… Se fantasiam de ciência, querendo usar a credibilidade que a ciência tem como instituição para vender um produto, serviço ou ideologia”, define a doutora em microbiologia e presidente do Instituto Questão de Ciência (IQC), Natalia Pasternak. 

Pseudociências como aromaterapia e reiki foram incluídas no SUS em 2006.Pseudociências como aromaterapia e reiki foram incluídas no SUS em 2006.

O IQC é o primeiro instituto brasileiro voltado à defesa de políticas públicas baseadas em evidências científicas. Uma de suas lutas é para que as chamadas Práticas Integrativas Complementares em Saúde (PICs) que foram incluídas no SUS em 2006, como homeopatia, ozonioterapia, reiki e aromaterapia, deixem de ser financiadas com dinheiro público.

Mas se não há comprovação científica, o que leva as PICs a serem oferecidas pelo SUS? Segundo Pasternak, não há dúvidas de que o lobby, pressão de grupos organizados com motivações financeiras sobre o poder público, foi decisivo neste processo.

“Eles aproveitam essa permeabilidade do sistema legislativo e jurídico brasileiro e por canetada mesmo, do Executivo ou do Legislativo, conseguem legitimar essas pseudociências de uma maneira que nunca conseguiriam de forma acadêmica ou científica.”

A especialista explica que a inclusão de tais práticas no SUS tem o impacto direto de que práticas sem comprovação científica são financiadas com dinheiro público, dividindo o orçamento com áreas da atenção básica de saúde, como vacinação ou distribuição de anticoncepcionais. 

Por outro lado, sua inclusão no SUS oferece credibilidade a tais práticas. “O cidadão comum vai olhar para tudo isso e pensar que se está no SUS, é porque funciona, então vou usar.” Assim, é motivada a busca por tais práticas também fora da saúde pública

Uso de terapias sem comprovação científica pode atrasar ou impedir diagnósticos e tratamentos adequados.Uso de terapias sem comprovação científica pode atrasar ou impedir diagnósticos e tratamentos adequados.

Além disso, Pasternak afirma que o uso de tais práticas pode atrasar ou impedir o diagnóstico de doenças graves, que poderiam ser solucionadas se tivessem um diagnóstico claro e em tempo adequado.

“Você tratar uma pessoa com diversos tipos de queixas com práticas que não são comprovadas, mas oferecem um efeito placebo ou conforto momentâneo, mas não duradouro e muito menos curativo, pode atrasar o diagnóstico de um câncer que poderia ser removido cirurgicamente, ou o tratamento de diabetes que precisa começar o mais rápido possível”, exemplifica a pesquisadora.

Como combater as pseudociências?

Para Gabriela Bailas, física e comunicadora científica, o combate deve começar com a educação básica nas escolas, com o incentivo ao pensamento crítico e maior compreensão do papel das ciências no cotidiano.

Mas o reconhecimento no dia a dia do que é pseudociência não é fácil. “Esse é um exercício bem complicado, porque estamos falando de pessoas que enganam outras através da vulnerabilidade. Por melhor que seja o nosso pensamento crítico e por mais céticos que sejamos, no momento de vulnerabilidade e desespero acreditamos em tudo.”

Neste sentido, Bailas recomenda não acreditar em curas fáceis ou milagrosas, e fazer algumas perguntas básicas ao ler qualquer informação: 

  • Quem disse isso?
  • Por que essa pessoa quer que eu acredite nisso?
  • O que ela ganha comigo acreditando nisso?
  • O que sei sobre esse tema e o que outras pessoas falaram sobre o assunto?

Além disso, o cuidado de jornalistas e comunicadores científicos faz diferença. “Muitos jornalistas ajudam na propagação de pseudociência ao reproduzir informação sem verificar ou conversar com cientistas”, explica.

Pasternak concorda que esta é uma missão complicada, e que o incentivo ao pensamento crítico é essencial. “Normalmente a gente diria para o cidadão se informar em fontes oficiais, mas no Brasil, se você entrar no site do Ministério da Saúde, vai ler uma descrição das PICs como se fossem a coisa mais maravilhosa do mundo”, comenta.

Por isso, é fundamental reconhecer e refletir sobre os mecanismos das pseudociências, que foram similares a muitos utilizados durante a pandemia de covid-19. “O que a gente vê hoje, e infelizmente isso é muito comum, são pessoas que foram absolutamente contra remédios milagrosos para covid-19 como cloroquina e ivermectina, mas protegem ardentemente técnicas igualmente sem plausibilidade como a homeopatia, e não conseguem perceber que o mecanismo para aceitação dessas técnicas é exatamente o mesmo.”