Como a gravidade curva a luz?

3 min de leitura
Imagem de: Como a gravidade curva a luz?
Imagem: NASA

No final do século XIX, o que os cientistas acreditavam ser os blocos fundamentais da ciência estavam modificando rapidamente, levando a perspectivas diferentes e conflitantes. No campo da Física, uma série de novos fenômenos desafiavam o paradigma científico vigente, não podendo ser descritos por meio dos modelos clássicos das teorias.

Esse clima efervescente teve como ápice a criação, no início do século XX, de duas das teorias científicas mais bem-sucedidas de todos os tempos: a mecânica quântica e a teoria da relatividade geral. Esta última, publicada pela primeira vez por Albert Einstein no ano de 1915, é uma teoria geométrica da gravidade e é considerada por muitos físicos como uma das mais belas descrições da natureza já feitas.

Albert Einstein em 1931.Albert Einstein em 1931.Fonte:  Domínio Público 

A relatividade geral pôs em cheque a nossa compreensão do comportamento de um dos aspectos mais fundamentais de todos: a luz. Como aprendemos na escola, de acordo com a Física clássica, a luz sempre se propaga em linha reta em um meio homogêneo e transparente.

Mas o que acontece quando ela passa perto de uma grande massa? A luz simplesmente continua em linha reta, sem ser desviada de seu caminho original? Ela experimenta uma força devido aos efeitos gravitacionais do objeto próxima? Como isso seria possível, se os fótons não têm massa?

De fato, a nova teoria de Einstein previu que os feixes de luz, como por exemplo aqueles emitidos por estrelas distantes, viajariam ao longo de trajetórias curvas ao passarem por regiões onde houvesse uma grande quantidade de massa, como a região do espaço-tempo distorcida pelo Sol. Ao usar as novas equações da relatividade geral, Einstein calculou a forma matemática dessas trajetórias curvas. Eis como isso ocorre.

Deflexão da luz de uma estrela distante pela distorção causada pelo Sol.Deflexão da luz de uma estrela distante pela distorção causada pelo Sol.Fonte:  Pearson Education 

Imaginemos o seguinte: uma bola de boliche encontra-se acima de um colchão, sendo a bola um objeto massivo – como o Sol – e o colchão o espaço-tempo em si, no qual ele se encontra. Embora o espaço-tempo seja uma estrutura quadridimensional, nosso cérebro costuma ter dificuldades em imaginar isso, optemos pelo didatismo.

Na presença da bola de boliche, a região do colchão a qual ela se encontra tem sua superfície deformada. Se linhas de grade fossem desenhadas no colchão, veríamos essa grade se deformar, com as linhas das caixas próximas da bola não ficando mais retas, porém curvas. Esse exemplo simples é uma boa analogia para o fato que acontece com uma estrela situada no espaço: a estrela deforma o tecido do espaço-tempo ao seu redor, fazendo com que ele se curve em direção à estrela.

Representação da distorção da luz de uma estrela distante no espaço-tempo curvo.Representação da distorção da luz de uma estrela distante no espaço-tempo curvo.Fonte:  Astronomy Magazine 

Em outras palavras, a luz é defletida na presença de uma massa, não porque esta atrai os fótons diretamente, mas porque a massa distorce o espaço-tempo através do qual os fótons viajam. Como praxe na atividade científica, essa previsão deveria ser testada. Mas como?

Logo após a publicação da relatividade geral, Einstein calculou explicitamente a separação angular que as posições das estrelas distantes sofreriam quando sua luz passasse pela distorção causada pelo Sol.

Isso não poderia ser observado, obviamente, em condições normais, pois não é possível observar estrelas além do Sol durante o dia. Mas quando ocorre um eclipse solar total, especialmente se o eclipse for de longa duração e os céus ficarem muito escuros, as estrelas podem se revelar a um observador dedicado.

Foi justamente isso que tentou-se fazer nos anos que sucederam a publicação da relatividade geral: houve um eclipse solar total em 1916, mas a Primeira Guerra Mundial impediu que as observações críticas fossem feitas. Um outro eclipse ocorreu em 1918, mas as nuvens intervieram, interrompendo os planos de observação.

Representação do eclipse solar de 1919 feita por um folhetim inglês.Representação do eclipse solar de 1919 feita por um folhetim inglês.Fonte:  London News/Domínio Público 

No dia 29 de maio de 1919, no entanto, um eclipse muito longo estava programado para passar pelo Brasil e na Ilha do Príncipe, na África Ocidental. Duas expedições foram, então, organizadas: a brasileira foi para a cidade de Sobral, no Ceará, e a inglesa, liderada por Sir Arthur Eddington foi para África.

O eclipse, que durou cerca de seis minutos de totalidade, foi o campo de testes ideal para a teoria de Einstein. Embora a controvérsia tenha cercado os resultados por muitos anos, eles foram consistentes com as previsões de Einstein que existiram aos exames mais minuciosos e aos testes do tempo.

Galáxia distorcendo a luz de uma galáxia mais distante (à direita) criando um Anel de Einstein.Galáxia distorcendo a luz de uma galáxia mais distante (à direita) criando um Anel de Einstein.Fonte:  NASA 

Hoje, o fenômeno de distorção da luz é inteiramente compreendido e se manifesta em diversos cenários espetaculares no Universo, como as lentes gravitacionais, amplamente utilizadas pelos astrônomos para estudar objetos longínquos e remotos do nosso passado cósmico.

Você sabia que o TecMundo está no Facebook, Instagram, Telegram, TikTok, Twitter e no Whatsapp? Siga-nos por lá.