Covid-19: coronavírus infecta e se replica em glândulas salivares

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Imagem: Fonte: Fusion Medical Animation/Unsplash.

O vírus responsável pela covid-19 (SARS-CoV-2) infecta e se replica em células das glândulas salivares. A descoberta foi feita por pesquisadores da Faculdade de Medicina da USP (FMUSP), com apoio da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp), e publicada recentemente no Journal of Pathology. O estudo contribui para explicar ao mundo por que o novo coronavírus é encontrado em grandes quantidades na saliva humana.

Glândulas salivares possuem receptor que se liga com o novo coronavírus.Glândulas salivares possuem receptor que se liga com o novo coronavírus.Fonte:  Freepik 

Glândulas salivares na mira dos cientistas

A equipe da USP analisou amostras de três tipos de glândulas salivares — parótida, submandibular e menores —, obtidas durante a autópsia de pacientes que morreram em decorrência de complicações da covid-19 no Hospital das Clínicas da FMUSP. Foram feitas biópsias em 24 pacientes com idade média de 53 anos, nas quais a equipe percebeu que os tecidos especializados na produção de saliva servem como reservatórios para o novo coronavírus.

Imagem de microscopia eletrônica mostra o novo coronavírus no interior das glândulas salivares.Imagem de microscopia eletrônica mostra o novo coronavírus no interior das glândulas salivares.Fonte:  Bruno Matuck/USP/Reprodução 

O relato é o primeiro sobre um vírus respiratório capaz de infectar e se replicar nas glândulas salivares. Acreditava-se que apenas vírus causadores de doenças com prevalência muito alta, como o da herpes, usavam as glândulas salivares como reservatório. Bruno Fernandes Matuck, doutorando na Faculdade de Odontologia (FO) da USP e primeiro autor do estudo, disse, em entrevista à Agência de Notícias da Fapesp, que isso pode ajudar a explicar o por que de o SARS-CoV-2 ser tão infeccioso.

Um estudo anterior havia demonstrado a presença de RNA do vírus causador da covid-19 no tecido periodontal de pacientes que morreram em decorrência da doença. Devido à sua alta infecciosidade, a equipe levantou a hipótese de que o novo coronavírus poderia infectar e se replicar em células das glândulas salivares — sem contato com secreções nasais e pulmonares.

Estudos internacionais já haviam demonstrado que o ducto salivar possui o receptor ACE-2 — ao qual a proteína spike do SARS-CoV-2 se liga. Depois, outros cientistas observaram em estudos feitos com animais que, além da ACE-2, outros receptores presentes nos tecidos das glândulas salivares são alvos do novo coronavírus. Então, a hipótese foi testada em humanos: análises moleculares (RT-PCR) das amostras indicaram a presença do vírus em mais de dois terços delas.

Os pesquisadores marcaram uma molécula com um corante que se une ao vírus e aos receptores. Assim observaram o vírus in situ — no interior dos tecidos. Depois, utilizando microscopia eletrônica, detectaram que o vírus se replicava neles. "Observamos vários vírus aglomerados nas células das glândulas salivares — um indicativo de que estão se replicando em seu interior. Não estavam presentes nessas células passivamente", afirmou Matuck.

Como nos infectamos com a covid-19?

Como a boca tem uma área de contato maior do que a cavidade nasal — hoje apontada como a principal porta de entrada do vírus —, a hipótese que o grupo vai analisar agora é se ela pode ser uma porta de entrada direta para o SARS-CoV-2. A hipótese é bastante plausível, já que os receptores do vírus são encontrados em vários locais do órgão, como gengiva e mucosas.

O grupo vai mapear esses receptores e quantificar as replicações nos tecidos em parceria com pesquisadores da Universidade da Carolina do Norte, dos Estados Unidos, conforme explicou Luiz Fernando Ferraz da Silva, professor da FMUSP e coordenador do projeto. "Pode ser que a boca seja um meio viável para entrada direta do vírus", reforçou Matuck.

O estudo também deve verificar se pessoas idosas possuem mais receptores ACE-2 na boca em comparação com pessoas mais jovens, embora mesmo nesses pacientes com menos tecidos salivares, o estudo tenha encontrado alta carga viral. Matuck explicou que, mesmo quase sem tecido salivar, com muita presença de tecido gorduroso, esses pacientes ainda apresentavam uma carga viral relativamente alta.

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