Especial 40 anos da Voyager: a missão espacial mais duradoura da História

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O verão de 1977 foi marcado por diversos acontecimentos importantes: Elvis Presley fez seu derradeiro show e, menos de um mês depois, faleceu no banheiro de sua casa; a banda Led Zeppelin tocou pela última vez em território norte-americano; o serial killer conhecido como “Filho de Sam” foi preso em Nova York; e o computador Commodore PET foi vendido pela primeira vez.

Nesse verão, a Agência Espacial Nacional norte-americana (NASA) estava trabalhando a todo vapor: no dia 12 de agosto de 1977, o ônibus espacial Enterprise fez seu primeiro teste de voo livre sobre um avião Boing 747, e, no fim do mesmo mês, um dos programas mais ambiciosos da agência espacial saiu do papel para o espaço sideral – Voyager, com a sonda Voyager 2 lançada em 20 de agosto e, em seguida, a Voyager 1, em 5 de setembro, há exatamente 40 anos.

Representação de uma sonda Voyager

Agradável surpresa

Para a surpresa dos cientistas, as duas Voyager se provaram muito mais duradouras do que o esperado

O programa Voyager consiste em duas sondas robóticas – Voyager 1 e Voyager 2 – que foram lançadas da Terra com destino à parte externa de nosso Sistema Solar. Durante o caminho, as duas naves tiveram como missão estudar de perto os quatro gigantes de gás que orbitam o Sol, além do Cinturão de Asteroides: Júpiter, Saturno, Urano e Netuno. Praticamente tudo o que se conhece sobre os dois últimos deve-se unicamente às duas sondas.

Acontece que, originalmente, as duas espaçonaves foram construídas para durar apenas cinco anos e para obter informações apenas sobre Júpiter, Saturno e seus satélites naturais, visto que a agência espacial considerava muito caro preparar as sondas para visitar os quatro planetas. Para a surpresa dos cientistas, as duas Voyager se provaram muito mais duradouras do que o esperado e a exploração de Urano e Netuno foi deliciosamente inevitável.

Alinhamento dos planetas

O lançamento das sondas Voyager foi minuciosamente calculado – aconteceu em uma data que se repete apenas a cada 175 anos aproximadamente: um alinhamento entre os quatro planetas gasosos do Sistema Solar que havia acontecido anteriormente em 1802 e só vai acontecer novamente no ano 2152. Assim, caso eles dessem muita sorte e as sondas suportassem mais do que o estudo de Júpiter e Saturno, era só dar mais um “passinho” até os outros.

A técnica usada nas sondas Voyager permitiu que a viagem até Netuno, o mais distante desses planetas, durasse 12 anos em vez de 30

Esse arranjo planetário foi crucial para o sucesso da missão – a proximidade entre eles permitia que as sondas viajassem de planeta em planeta sem a necessidade de gastar muitos recursos. A técnica usada nas sondas Voyager – de se aproximar dos astros para ter sua trajetória corrigida e ganhar impulso com a gravidade – permitiu que a viagem até Netuno, o mais distante desses planetas, durasse 12 anos em vez de 30.

O alinhamento planetário permitiu que as sondas Voyager percorressem todos esses planetas

Voyager 1 e 2

As duas sondas lançadas do Cabo Canaveral, na Flórida, eventualmente tomaram caminhos diferentes na exploração dos distantes planetas. Lançada primeiro, a Voyager 2 demorou quase dois anos para se aproximar de Júpiter. Após passar por Saturno mais dois anos depois, a nave realizou os primeiros e únicos voos até hoje sobre Urano e Netuno, sendo capaz de registrar a Supernova 1987A no caminho.

Já a aniversariante do dia, a Voyager 1, partiu há exatos 40 anos também do Cabo Canaveral, mas chegou a Júpiter e, posteriormente, Saturno, um pouco antes que sua irmã mais velha. Lá, ela teve como missão estudar Titã, o maior satélite natural do Planeta dos Anéis.

Ao contrário da Voyager 2, que seguiu de Saturno para explorar Urano e Netuno, a Voyager 1 rumou dali diretamente para fora do Sistema Solar, mas não sem antes enviar para a Terra sua última fotografia: um retrato do Sistema Solar, feito a pedido do astrônomo Carl Sagan, no qual é possível ver nosso planeta como um pequeno ponto azul (ou Pale Blue Dot, o nome dado à imagem, "ponto azul pálido") junto a tantos outros astros. Foi essa foto que popularizou a seguinte frase de Sagan:

"Considere novamente esse ponto: isso é aqui. Isso é nosso lar. É a gente. Nele, cada um que você ama, cada um que você conhece, cada um que você já ouviu falar, cada ser humano que já existiu, viveu sua vida. O agregamento de nossa alegria e nosso sofrimento, milhares de religiões confiantes, ideologias e doutrinas econômicas, cada caçador e coletor, cada herói e covarde, cada criador e destruidor da civilização, cada rei e camponês, cada jovem casal apaixonado, cada mãe e pai, filho esperançoso, inventor e explorador, cada professor de moral, cada político corrupto, cada ‘superstar’, cada ‘líder supremo’, cada santo e pecador da história de nossa espécie viveu lá – em um pedaço de poeira suspenso em um raio de sol".

Blue Pale Dot: o pequeno pontinho azul no lado direito central da foto é a Terra. Tudo o que você já conheceu e vivenciou está nele.

Em um lugar muito, muito distante

Em 1998, 21 anos após seu lançamento, a Voyager 1 ultrapassou as sondas Pioneer 10 e 11 e se tornou o objeto criado por humanos mais distante do planeta Terra. Em dezembro de 2004, a sonda finalmente chegou aos limites do Sistema Solar, a caminho de sair da heliosfera – região periférica do Sol e que é preenchida por ventos solares – e entrou de fato no espaço interestelar só em agosto de 2012.

A sonda Voyager 1 bate com folga o recorde, estando a aproximadamente 20,8 bilhões de quilômetros de distância do Sol

Quando a Voyager 2 seguiu o mesmo caminho de sua parceira e atingiu o “choque de terminação” (onde os ventos solares diminuem por influência de outras estrelas) três anos depois de sua irmã, ela estava a mais de 1,5 bilhão de quilômetros mais perto do Sol do que quando a Voyager 1 cruzou a “fronteira”, provando para os cientistas que o Sistema Solar não é nada simétrico.

Na data de seu aniversário, a sonda Voyager 1 bate com folga o recorde, sendo o objeto mais distante da Terra já criado pelo homem, estando a aproximadamente 20,8 bilhões de quilômetros de distância do Sol. Isso é equivalente a 139 vezes a distância entre a Terra e o Sol ou 3,6 vezes o espaço entre a Terra e Plutão.

Distante de tudo e todos: a Voyager 1 foi onde nenhum objeto criado pelo ser humano já esteve

Descobertas importantes

A exploração realizada pelas sondas Voyager foram de importância sem igual para o desenvolvimento do nosso conhecimento sobre o Sistema Solar. A Voyager 2, em suas paradas providenciais em Urano e Netuno, descobriu nada menos que 11 satélites naturais em Urano, cada uma com suas particularidades geológicas e, em Netuno, a sonda pôde observar a Grande Mancha Escura, uma tempestade anticiclônica milenar na superfície do planeta.

As duas sondas partiram em busca das fronteiras do Sistema Solar, abandonando a exploração dos planetas e enviando para a Terra informações importantes sobre essa área

Já a Voyager 1 explorou com detalhes Júpiter e Saturno, além de alguns de seus satélites. Foi essa sonda que descobriu os poderosos e superativos vulcões da lua Io, que orbita o maior planeta do Sistema Solar, e as tempestades de metano da densa atmosfera de Titã, a maior companheira do Planeta dos Anéis.

Após 1989, as duas sondas partiram em busca das fronteiras do Sistema Solar, abandonando a exploração dos planetas e enviando para a Terra informações importantes sobre essa área que só tem se tornado menos misteriosa graças às duas espaçonaves. A Voyager 1 já voa desde 2012 em uma região que sofre mais influência de outras estrelas do que do Sol, e a Voyager 2 deve chegar lá em alguns anos, pois ainda está atravessando o "choque de terminação".

Representação artística do Sistema Solar e a posição da heliosfera

Os discos dourados da Voyager

Apesar da distância enorme que as sondas Voyager já viajaram, ficando cada vez mais longe da gente, as baterias de plutônio das espaçonaves ainda devem durar mais uns 10 anos pelo menos, segundo a NASA. Com isso, de acordo com os cálculos de trajetória dos dispositivos, a Voyager 1 vai passar a uma distância de 1,6 anos-luz da estrela Gliese 445, da constelação de Camelopardalis ou Girafa.

A possibilidade de acesso tão “próximo” a outros sistemas solares fez com que os cientistas responsáveis pelas sondas tivessem uma ideia antes de lançá-las: transformá-las em uma espécie de "cápsula do tempo", embutindo nelas registros fonográficos na forma de discos dourados com sons e imagens que retratam a vida e a cultura terrestres.

Posicionamento do disco dourado na Voyager

Assim, caso alguma forma de vida inteligente extraterrestre tenha contato com uma das Voyagers algum dia, vai ser possível obter informações detalhadas sobre quem as fabricou. O conteúdo dos discos foi selecionado por um comitê liderado por Carl Sagan e reúne 115 imagens variadas (entre fotografias e dados científicos), uma seleção de sons diversos do cotidiano humano e uma seleção musical com 31 canções de diferentes culturas e eras, além de saudações gravadas em 55 idiomas antigos e novos.

Desde 2015, é possível ouvir todas as saudações registradas nos discos dourados por meio do perfil da NASA no Soundcloud clicando neste link e a seleção de sons do cotidiano clicando neste link. Confira na galeria a seguir algumas das imagens contidas nos discos:

Fabricados com cobre e folheados a ouro, os discos possuem 30 centímetros de diâmetro e são cobertos por uma capa de alumínio galvanizado com uranio-238 puro, que possui uma meia-vida de quase 4,5 bilhões de anos. Ou seja: mesmo quando a bateria das sondas acabar e elas se perderem totalmente vagando pelo espaço interestelar, ainda vai ser possível, caso existam, que outras formas de vida descubram quão fascinante é (ou foi) a civilização que criou o programa Voyager.

Feliz aniversário, Voyager 1!

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