Como as startups podem reter talentos usando o stock option

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Quando se abre uma empresa, além de todo o conhecimento dos fundadores, dos sócios e do produto ou serviço a ser comercializado, é preciso que os colaboradores sejam comprometidos e dedicados e trabalhem satisfeitos e felizes.

Sem isso, as chances de a empresa quebrar são reais. Um bom ambiente de trabalho, hoje, é um diferencial para a permanência das pessoas.

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É o sonho de todo empresário ter uma equipe comprometida, mas, como esse é um desejo de todo empreendedor, quando se encontra alguém com essas características, mesmo que esteja empregado em outra empresa (que nem precisa ser concorrente), é comum que sejam feitas propostas de trabalho. Em uma economia de livre mercado, se a empresa pode dispensar o colaborador a qualquer momento, então este também pode escolher se desligar, ainda mais se lhe forem oferecidas vantagens melhores do que as que ele tinha.

Então como reter esses talentos se, no caso de uma startup, por exemplo, ainda não há dinheiro suficiente para cobrir ofertas muito predatórias? O negócio pode ser muito promissor, mas se o empregado não receber benefícios será muito difícil permanecer na empresa.

Uma solução é a adoção de um contrato de stock option, que é muito usado com quem exerce cargos estratégicos, visando cada vez mais motivá-los a fazer que o valor da empresa aumente e eles permaneçam prestando serviços por muitos anos em troca de um pequeno percentual da companhia. Se houver a venda (o termo correto é "cessão") de parte da empresa ou dela inteira, o colaborador é recompensado por seus esforços e por sua lealdade, recebendo em dinheiro o valor referente à  participação nas cotas ou nas ações.

Esse contrato pode ser usado em empresas de qualquer tamanho, de qualquer segmento e a qualquer momento, desde que a alteração do contrato de trabalho seja negociada e aceita pelo colaborador e que não haja prejuízo, de acordo com o art. 468 da Consolidação das Leis do Trabalho (CLT). Porém, é preciso ter em mente que a adoção dessa opção só é recomendada para empregados estratégicos e se há intenção real de, no futuro, vender a empresa.

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Na prática, o stock option é um contrato de trabalho de longa duração, feito de forma livre e consentida entre a empresa e o colaborador estratégico, em que as partes negociam que se essa pessoa permanecer trabalhando por um período mínimo ela será presenteada gradativamente com um percentual das cotas ou das ações da companhia; ou seja, há um evento de vesting, que quer dizer que o empregado estará “vestido” e poderá receber os percentuais das cotas em datas estabelecidas pelas partes. Depois disso, se houver a cessão da empresa, ele recebe em dinheiro o percentual referente às cotas a que teve direito.

A intenção é que essas pessoas se sintam um pouco “donas” da empresa e façam de tudo para que ela continue a dar lucros e se valorize cada vez mais no mercado e para que seja ainda mais interessante se manter na empresa, não partindo para concorrentes ou empreendimentos pessoais. Além disso, espera-se que valorizem o fato de que quanto mais tempo permanecerem na empresa, mais cotas ganharão, por isso se a empresa se valoriza todos ganham com a venda futura dela.

O contrato de stock option não tem validade imediata, então o trabalhador não se torna detentor das cotas ou das ações da empresa quando o assina. É comum que seja fixada uma data longa para o vesting, cerca de 5 anos a contar da assinatura, e só a partir de então, gradativamente e em datas fixadas pela empresa, o colaborador passe a receber os percentuais a que tem direito até atingir o limite máximo estabelecido. Os eventos em que o empregado recebe parte desse percentual são chamados de cliff.

É importante deixar claro que em hipótese alguma o empregado é transformado em sócio ou considerado acionista da empresa, já que não é realizada alteração do contrato ou do estatuto social. Nem mesmo ele tem poder de gerir o negócio como sócio ou participar de votações. O que ele tem é uma expectativa de, no futuro, ser recompensado financeiramente por seus esforços.

Algumas pessoas podem pensar que “esse contrato é uma exploração da força do trabalhador pelo patrão”, porém é preciso deixar claro que o empregado não perde nenhum direito trabalhista nem deixa de ser empregado por ter aderido ao programa de stock option da empresa. Na verdade, é um reconhecimento. Mas e se ele se desligar da empresa ou for dispensado?

Como se trata de um contrato com uma expectativa de direito e que tem a intenção de reter os talentos por um longo período, se o empregado se desligar o stock option perde a validade, mesmo que ele já esteja “vestido” e já tenha recebido algum percentual das cotas da empresa, pois não ocorreu o chamado “evento de liquidez”, ou seja, a venda da empresa.

Por outro lado, como não é a intenção dispensar esse tipo de empregado, se isso ocorrer as disposições do stock option também perdem a validade, mas vamos analisar com um pouco mais de calma a situação. A dispensa foi motivada por qual razão? Não é preciso justificar o encerramento de um contrato de trabalho, mas se a companhia dispensou a pessoa para não pagar o valor das cotas que ela recebeu, pode ser considerada fraude, então se o empregado ingressar com uma ação judicial pode ter reconhecido o direito. Se a dispensa foi injustificada, mas não houve fraude, também não há nada a ser pago, já que o colaborador não tem estabilidade e não há proibição alguma do encerramento do contrato.

Quando se trata de empregados de alta gerência, a situação fica ainda mais fácil de ser negociada, já que o parágrafo único do art. 444 da CLT diz respeito à livre estipulação de contratos de trabalho entre as partes, então, desde que não haja infração à lei, nada impede a ampla negociação.

O contrato de stock option, se usado de forma correta e de acordo com os interesses da empresa, é uma ótima forma de reter talentos por muito tempo, mas deve ser negociado sempre de forma transparente e com boa-fé, devendo ser respeitado depois de assinado, obrigando a empresa a ceder os percentuais e a pagar o empregado o valor a que ele tiver direito em caso de venda.

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Rofis Elias Filho, colunista do TecMundo, é geek e advogado, apaixonado por tecnologia desde pequeno. Foi o primeiro da rua a ter internet em casa, em 1994, e se especializou em Direito da Informática no Brasil e em Portugal. Hoje, é professor da mesma matéria em diversas instituições, tendo sido coordenador-executivo da pós-graduação da ESA/SP. É sócio do escritório Elias Filho Advogados, que advoga para diversas empresas de tecnologia no Brasil e no exterior. Siga nas redes sociais para mais dicas: @eliasfilhoadv.

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