Entenda como o bloqueio de recursos da Capes afeta a ciência brasileira

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Faltando menos de um mês para o fim do governo de Jair Bolsonaro (PL), o Ministério da Economia impôs fortes cortes orçamentários à Educação que impedirão o pagamento de bolsas de pesquisa pela Capes (Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior).

O golpe duro foi recebido com indignação pela comunidade científica. É através de bolsas de pesquisa que a maior parcela de pesquisadores do país (alunos de mestrado e doutorado) conseguem se manter, e sem elas pode haver um apagão da ciência brasileira.

Último de uma série de cortes

Segundo a Capes, os novos cortes do Ministério da Educação impediram o pagamento das bolsas que estavam previstas para a última quarta-feira, 7. A falta de dinheiro também deve afetar a administração da própria entidade.

No total, foram congelados R$ 208 milhões que seriam destinados aos institutos federais e outros R$ 244 milhões das universidades públicas.

O MEC, nesta semana, já havia anunciado que não poderia pagar também as bolsas de cerca de 14 mil médicos residentes do país. A residência é um tipo de especialização para médicos que querem receber treinamento prático de atuação em hospitais e centros de saúde.

Em nota, o órgão diz que cobrou das autoridades a imediata desobstrução dos recursos financeiros essenciais e que os bolsistas já começam a sofrer severa asfixia.

A Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC), também em nota, afirma que a manobra foi perversa, e que prejudica milhares de jovens profissionais e estudantes cortando, impedindo as atividades acadêmicas e de pesquisa.

A ciência brasileira vive só de bolsa?

A massa de cientistas brasileiros é composta de professores, pesquisadores e alunos de doutorado, mestrado ou especialização, e o grosso da ciência é feito dentro das universidades, principalmente as públicas.

Apenas os professores recebem um salário fixo. E, apesar de orientar os trabalhos, de maneira geral não são eles que colocam a mão na massa. Ao entrarmos em um laboratório de pesquisa no nosso país iremos nos deparar mesmo é com os alunos de pós-graduação, seja doutorado ou mestrado, ou um pesquisador de nível de pós-doutorado, que dependem de uma bolsa de pesquisa.

Só a Capes é responsável pelo pagamento de mais de 200 mil desses profissionais, que trabalham sem férias, décimo-terceiro ou qualquer outro direito trabalhista. E sem outra fonte de renda, porque as bolsas, em geral, possuem uma cláusula de dedicação exclusiva.

Dentro dos laboratórios das universidades brasileiras o principal da ciência é feito (Fonte: Unplash/Talha Hassan)Dentro dos laboratórios das universidades brasileiras o principal da ciência é feito (Fonte: Unplash/Talha Hassan)Fonte:  Unplash 

O órgão é vinculado ao Ministério da Educação (MEC) e, quando o assunto é financiamento da ciência brasileira, compartilha o protagonismo com o CNPq (Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico), vinculado à pasta de Ciência, Tecnologia e Inovações.

Juntos, esses dois órgãos públicos são responsáveis pelo financiamento da maioria dos bolsistas brasileiros. Somam-se a eles a atuação de fundações estaduais de amparo, como a Fapesp, de São Paulo. No Brasil, uma porcentagem pequena do dinheiro para pesquisa vem de instituições privadas

Se as condições duras de trabalho e a falta de reconhecimento já eram questionadas por pesquisadores brasileiros, nos últimos anos começou a chamar a atenção a falta de reajuste dos valores da bolsa, que perdeu poder de compra nos últimos anos.

Hoje, um aluno de mestrado recebe da Capes ou do CNPq uma bolsa de R$1.500, de doutorado é R$2.220, e uma bolsa de pós-doutorado paga R$4.100 por mês, valores bem abaixo do que paga o mercado para os profissionais de mesmo nível.

As bolsas, portanto, já são consideradas pela comunidade como menos do que um salário digno. Com ela, os alunos precisam arcar com as despesas pessoais, como aluguel, já que muitos têm de se mudar para as cidades onde estão os centros de pesquisa.

Além disso, os gastos do trabalho acabam entrando na conta. Livros de pesquisa, material de laboratório, membresias de sociedades científicas, taxas de publicação ou gastos para participar de congressos são algumas das dispesas extras que podem cair na conta do aluno.

De todo o necessário para estabelecer uma ciência forte, valorizar o elemento humano é o mais importante. Países como os Estados Unidos, a Alemanha ou a Austrália reconhecem os seus pós-graduando como profissionais, e não alunos, como no Brasil.

A falta de bolsas e os atrasos nos pagamentos que vem ocorrendo nos últimos anos já gerou escassez de mão-de-obra e o fenômeno da fuga de cérebros, saída desses profissionais na busca de melhores oportunidades no exterior. Uma paralisação total nos pagamentos pode ser a última pá de terra sobre a ciência nacional.

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