Procon suspende Google de limitar drive de universidade mineira

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Imagem: Universidade Federal de Juiz de Fora/Reprodução

O Procon de Juiz de Fora (MG) proferiu decisão cautelar que impede o Google de encerrar o drive ilimitado do Workspace For Education de alunos, funcionários e professores da Universidade Federal de Juiz de Fora (UFJF). Se o ato — que é apenas preventivo — for descumprido, a empresa de tecnologia terá que pagar multa de R$ 1 milhão.

A decisão, que é de 21 de junho, determina que o Google “se abstenha de limitar o armazenamento da coletividade de usuários da UFJF a 100 terabytes até o julgamento final desse processo administrativo”. Ou seja, antigos e novos usuários da UFJF não terão os espaços no drive limitados a partir de julho, como acontecerá com todas as instituições de educação que fizeram parceria com o Google antes do fim de 2021.

A deliberação do Procon prevê que o Google se abstenha de cortar o tamanho do espaço em nuvem pelo menos até 20 de julho, quando será realizada uma audiência de conciliação entre as partes. No período, será tentada a assinatura de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) junto à companhia.

UFJFUniversidade Federal de Juiz de Fora. (Fonte: Alexandre Dornelas/UFJF)

O TecMundo conversou com Eduardo Floriano, superintendente do Procon de Juiz de Fora, que explicou que a decisão vale até o fim do processo (que não tem data) e que tem repercussão apenas no caso dos usuários da UFJF, já que a competência do Procon é municipal.

"[...] nada impede que outros órgãos [...] possam adotar semelhantes procedimentos"

“Contudo, nada impede que outros órgãos, tomando conhecimento dos fatos, possam adotar semelhantes procedimentos”, salienta Floriano.

Possíveis penalidades

O superintendente pontua que uma medida cautelar é provisória, então não indica o fim de um processo. No caso do Google e da UFJF, a decisão temporária foi tomada porque “havia risco de perecimento [extinção] de direito durante a tramitação do processo”.

“O processo continua com a análise da situação e a decisão poderá reconhecer a violação aos direitos dos consumidores ou pelo arquivamento do caso”, elucida Floriano.

Floriano lista que, se a ação do Google de encerrar o drive ilimitado for reconhecida como uma violação, a empresa poderá ser punida conforme o artigo 56 do Código de Defesa do Consumidor (CDC).

CDCCódigo de Defesa do Consumidor.

O trecho específico indica que a companhia está sujeita, sem prejuízos de natureza civil ou penal, às penalidades de:

  • multa;
  • apreensão do produto;
  • inutilização do produto;
  • cassação do registro do produto junto ao órgão competente;
  • proibição de fabricação do produto;
  • suspensão de fornecimento de produtos ou serviço;
  • suspensão temporária de atividade;
  • revogação de concessão ou permissão de uso;
  • cassação de licença do estabelecimento ou de atividade;
  • interdição, total ou parcial, de estabelecimento, de obra ou de atividade;
  • intervenção administrativa;
  • imposição de contrapropaganda.

A decisão

O TecMundo teve acesso à decisão administrativa cautelar do Procon que impede o Google de encerrar o drive ilimitado da UFJF em julho. O parecer foi assinado por Carla de Abreu Marques, gerente do Departamento de Apuração de Práticas Infrativas do Procon de Juiz de Fora.

Na decisão, a gerente concorda com boa parte da argumentação apresentada na denúncia do professor aposentado Paulo Vilela, da Faculdade de Engenharia da UFJF. O documento indica, por exemplo, que o Google incentivou todos os usuários a utilizar de maneira ilimitada o Workspace for Education e que a empresa chegou a chamar de “mochila do estudante do século XXI”.

Apesar de concordar que o contrato da plataforma previa alterações na disponibilidade do serviço, a decisão aponta que o Google violou artigos do CDC que reconhecem a vulnerabilidade do consumidor.

Procon de Juiz de ForaProcon de Juiz de Fora. (Fonte: Rafaela Frutuoso/Arquivo)

Para encerrar o drive ilimitado, o Google chegou a alegar que houve “aumento exponencial da demanda pelo produto e consequentemente o armazenamento” e que por isso “foi preciso repensar o Workspace para permitir a distribuição equilibrada do espaço”. A gerente do Procon foi taxativa contra essa argumentação, que chamou de “pueril”.

“Isto porque, a uma das 10 maiores empresas do mundo que lida com os mais avançados algoritmos da história da humanidade tem, certamente, total capacidade de prever a situação acima indicada e adotar medidas razoáveis e compatíveis com a sua política de incentivo ao armazenamento ilimitado de arquivos”, diz um trecho da decisão.

A gerente do Procon defende que o Google deveria limitar o armazenamento de novos arquivos, e não ordenar a redução da capacidade de armazenamento de quem já utiliza o sistema. Ela reforça que, a partir dos novos critérios de 100 TB para cada instituição, a Federal de Juiz de Fora teria que apagar 600 TB de arquivos, já que atualmente são ocupados cerca de 700 TB pelos usuários da universidade.

Google DriveGoogle Drive.

“Assim, observa-se claramente o rompimento da boa-fé e frustração da legítima expectativa dos usuários-consumidores os quais, muitos deles, sequer possuem, neste momento, condições de arcar com o armazenamento pago dos arquivos hoje armazenados no drive da investigada [Google]. Ressalta-se que hoje a Universidade Federal de Juiz de Fora possui 46,9% de seus estudantes beneficiados por cotas”, está escrito em outro trecho.

"A Universidade Federal de Juiz de Fora possui 46,9% de seus estudantes beneficiados por cotas"

Por causa dessas argumentações, Marques decidiu pela concessão da medida cautelar contra o Google, já que enxergou uma “iminência da drástica supressão de arquivos dos usuários da UFJF, sem qualquer indicação da forma como esses dados serão excluídos”.

Possibilidades de acordo

Vilela contou ao TecMundo em março por que apresentou a denúncia contra o Google. Ele foi administrador de um dos domínios da plataforma na universidade e atualmente é consultor da instituição.

“O anúncio nos pegou de surpresa porque não pensávamos que um dia o armazenamento ilimitado poderia ser encerrado. O Google não nos informou sobre isso e o serviço não tinha nenhum asterisco dizendo sobre essa possibilidade. E nós achamos ruim a decisão porque ela vai impactar todo o uso da ferramenta e vai afetar um recurso que é vital para as universidades, já que são muitos os dados armazenados em nuvem”, argumentou o docente na época.

Em nova conversa com o TecMundo, Vilela comentou ter ficado satisfeito com a medida cautelar do Procon. Ele também considera essencial a reunião de conciliação que será realizada em 20 de julho.

UFJFCampus da Universidade Federal de Juiz de Fora. (Fonte: Carlos Mendonça/Prefeitura de Juiz de Fora)

“Será, de fato, a primeira reunião que sentaremos com o Google para uma negociação formal, pois até o presente momento a empresa tinha anunciado a decisão [de acabar com o armazenamento ilimitado] de forma unilateral e impositiva, sem aceitar qualquer tipo de discussão a respeito”, argumenta o docente.

O professor defende que cabe à gigante da tecnologia fazer uma oferta “bem generosa”. Sobre isso, ele lembra do conceito “Não seja mau”, que era um mote utilizado pela companhia como um código de conduta. Os termos foram utilizados em uma carta assinada pelos fundadores da marca em 2004, quando o Google lançou ações na bolsa de valores dos Estados Unidos.

GoogleGoogle.

“Não seja mau. Acreditamos firmemente que, a longo prazo, seremos mais bem servidos — como acionistas e de todas as outras formas — por uma empresa que faz coisas boas para o mundo, mesmo se renunciarmos a alguns ganhos de curto prazo”, dizia um trecho da carta.

Apesar de fazer questão de dizer que uma boa oferta do Google na reunião será aceita de primeira, o docente afirma que se a postura da companhia não mudar, pode ser que o processo seja ainda mais desgastante.

Na verdade, este é um processo que não terá vitoriosos plenos, imagino eu. Será bom para todos se não tiver perdedores”, finaliza.

Outro lado

Em nota ao TecMundo, o Google disse que por ora não comentará o caso. Porém, como já havia respondido, a empresa reitera que anunciou em fevereiro de 2021 as alterações na política de armazenamento do Workspace for Education.

Após o anúncio, a companhia explicou que “garantiu apoio às instituições impactadas para dar suporte durante a transição de modelo, oferecendo ferramentas de apoio de gestão de espaço de armazenamento”.

Google WorkspaceGoogle Workspace.

O Google afirma que, além do armazenamento de 100 TB que será entregue gratuitamente para todas as instituições de ensino parceiras será oferecido sem custos um armazenamento adicional (a empresa não especificou a quantidade exata) para instituições com mais de 20 mil usuários ativos.

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