Imagem de Dirt Rally 2.0
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Dirt Rally 2.0

Nota do Voxel
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DiRT Rally 2.0: O 'Rei do Rally' está de volta

"Direita seis longa, abre, mantenha-se à esquerda sobre salto longo, cinquenta e esquerda quatro, fecha para três flat", o navegador, que tem uma voz bastante familiar, me orienta. Eu vejo, com alguma dificuldade por conta da forte chuva, o começo da curva à direita, que desaparece em meio a um punhado de árvores. Sem hesitar, dou uma levantada leve no pedal do acelerador e aponto a dianteira para dentro, pressionando o pedal de volta para forçar uma saída de traseira e trazer o carro mais pra dentro, esperando pelo salto que me aguarda a mais de 180 km/h.

O carro fica a menos de um metro de onde eu gostaria de ter passado no interior da curva e, muito rápido, abre demais no salto, pousando na extremidade oposta da pista. A roda traseira direita entra numa valeta, perco o controle do carro, atravesso a pista de lado e, ao bater na ribanceira, começo uma série de dezenas de capotagens. Pauso o jogo, encosto a cabeça no volante, respiro o mais fundo que consigo antes de reiniciar o estágio (algo que tinha feito já mais de 40 vezes) e começo a rir... Porque, finalmente, DiRT Rally está de volta.

Quando fiz a análise do primeiro DiRT Rally lá em 2016, na ocasião de seu lançamento nos consoles, disse que ele era o "Dark Souls dos jogos de corrida" e, bem, isso não deixou de ser verdade em DiRT Rally 2.0: depois de uma leve escorregada em DiRT 4 – que foi um bom jogo, mas não fez o mesmo sucesso do predecessor –, a Codemasters conseguiu recuperar e botar DiRT no traçado certo e acelerando forte como o jogo de rally mais relevante da atualidade.

Mais importante, a desenvolvedora percebeu que não é preciso abrir mão da dificuldade para isso acontecer porque, no fim das contas, não há nada de fácil no rally: você está tentando dirigir a uma velocidade absurda em superfícies de pouca aderência, em trechos estreitos que você mal conhece, dependendo de um maluco falando quatro ou cinco instruções em 10 segundos para você ter uma ideia do que vem pela frente e, caso você erre, o que te aguarda na maioria das vezes é um desfiladeiro ou uma árvore pra você abraçar.

O rally é uma das categorias mais belas do automobilismo e parte dessa beleza está justamente no perigo que é inerente a esse estilo de corrida e em como os pilotos conseguem entrar em harmonia com as máquinas que pilotam para fazer tudo isso com maestria – e é justamente aí que DiRT Rally 2.0 entra: permitir que você sinta um pouquinho de como é passar por essa experiência.

A questão que deve ser respondida, no entanto, é: como o jogo se sai em relação aos seus antecessores e, mais ainda, como ele se sai diante dos grandes nomes do subgênero de rally, como é o caso de Richard Burns Rally? Hora de conferir a análise completa de DiRT Rally 2.0.

O Dark Souls dos jogos de corrida, revisitado

O paralelo dos jogos de rally com um dos estilos que mais se popularizou nos últimos anos nos games não é gratuito e nem leviano: se você pretende jogar um título dessas duas esferas, você tem que estar preparado para se desafiar e ser desafiado – e também para lidar com a frustração de tentativas e mais tentativas que podem (e vão) dar errado. Da mesma forma, obter sucesso dá a mesma sensação de superação e felicidade.

Diferente de DiRT 4, que tentou se tornar um pouco mais casual para atrair um público maior e não obteve o resultado esperado, DiRT Rally 2.0 trouxe de volta o compromisso ressuscitado por DiRT Rally de ser mais focado na simulação, mas aprimorou de forma assombrosa sua abordagem: a dificuldade permanece lá, mas o jogo faz questão de apresentá-la de uma forma mais cadenciada, na medida do possível.

Isso é feito através de um início do modo carreira com veículos mais fracos e de tração dianteira, IA numa dificuldade mais aceitável logo de cara (apesar de ser possível mexer nisso também) e… Só. Não sabe o que significam as orientações do seu navegador? Que pena. Não sabe o que cada botão faz? Entre no menu e procure, porque não tem uma corrida dedicada para ensinar os comandos nem nada parecido.

Nem mesmo os impactos dos diferentes níveis de degradação do solo ou das mudanças climáticas são explicados e você tem que se virar para continuar andando rápido, independente das adversidades. Além de tudo isso, a IA está substancialmente mais rápida nas dificuldades mais altas e também, se o sofrimento não for o bastante, há uma opção de danos extremos, que podem acabar com sua corrida sem grandes esforços.

Outro aspecto legal é que existe uma opção de “momentos inesperados”, que pode fazer com que você, por exemplo, encontre um piloto adversário com o carro encostado e quebrado à beira da estrada.

O ponto é que DiRT Rally 2.0 seguiu a mesma premissa de seu antecessor na série e não esconde que foi feito para quem realmente gosta da coisa. Isso, no entanto, não impede que novatos, curiosos e casuais possam experimentá-lo – e é aqui que o jogo começa a brilhar de verdade.

Um híbrido quase perfeito

Os fãs, apesar de gostarem bastante de DiRT Rally, ainda tinham algumas observações em relação à sensação de peso do carro e também a forma como alguns deles se comportavam. DiRT 4 deu uma guinada forte para adaptar a jogabilidade aos controles e isso fez com que o jogo perdesse um pouco da característica mais equilibrada nos volantes.

DiRT Rally 2.0, por sua vez, faz o que parecia impossível: no volante, com a câmera do cockpit e tudo mais, ele passa a sensação de ser quase um simulador. Os carros mais antigos de tração traseira demandam um cuidado enorme com a transferência de peso e uma modulação muito precisa do acelerador, enquanto os carros atuais com tração integral exigem que você seja cirúrgico nos inputs do volante para extrair o máximo possível da performance e os menores tempos.

O force feedback no volante ajuda você a fazer uma leitura precisa da aderência nas diferentes condições climáticas e diferentes superfícies e a experiência geral é extremamente satisfatória, com um polimento superior ao visto no DiRT Rally original – o que deve deixar a turma dos G29, G920 e afins bastante feliz, seja no PC ou nos consoles.

Por outro lado, basta ligar o seu controle (em especial o do Xbox One), colocar na câmera externa, ligar uma ou duas assistências e você tem, de imediato, um dos melhores simcades de rally disponíveis atualmente. A resposta dos carros com o controle é sensacional e pilotar na terra se torna algo delicioso e descomplicado, sendo desafiador na medida certa. Com todas as assistências ligadas, mesmo quem tem dificuldades com jogos de corrida pode começar a dar seus primeiros passos sem maiores problemas.

Esse caráter “híbrido” do DiRT Rally 2.0 foi uma das coisas que mais impressionaram durante o processo de análise. A capacidade de ser imersivo e relativamente realista com um volante, adaptando-se de forma imediata ao controle convencional e entregando uma experiência extremamente agradável é algo que, até agora, são pouquíssimos os títulos do gênero que conseguiram – e isso é quase revolucionário, algo que a Codemasters pode e deve se orgulhar de ter conseguido.

Uma experiência um pouco mais completa...

Um dos pontos importantes a respeito de como DiRT Rally 2.0 pode ser jogado é que ele oferece uma experiência um pouquinho menos crua que o primeiro game da série – mas igualmente objetivo. As mudanças mais substanciais é que agora, no modo carreira, você conta com a possibilidade de melhorar a sua equipe, treinando seu co-piloto e seus engenheiros para conseguir algumas melhorias pontuais.

Nenhuma delas vai te dar uma vantagem no curso normal das coisas, mas podem funcionar bem quando algo dá errado: seu co-piloto pode ser treinado para fazer uma troca de pneus mais rápida durante um estágio ou reduzir a penalidade quando você sai da pista e precisa reposicionar seu veículo. Seus engenheiros podem ser treinados para fazer consertos de forma mais eficiente e rápida durante sua parada numa área de serviço.

Os carros também podem ser equipados com até três melhorias de performance de motor que, em contraparte, impactam na durabilidade dos componentes (o que pode exigir consertos mais cedo que o normal).

Diga-se de passagem, lidar com a degradação dos equipamentos é algo que está presente mas tem um impacto muito pequeno no andamento do game, então você não vai precisar gastar muito tempo ou esforço com isso.

Essas mecânicas ajudam você a ter, de certa forma, um objetivo para perseguir no modo carreira. Além dele, você tem também o modo de Rally Histórico, que funciona como uma espécie de campeonato, no qual você escolhe a categoria e corre nos eventos selecionados pelo jogo; O modo FIA World RallyCross Championship, conteúdo licenciado do campeonato mundial de uma das categorias mais divertidas do esporte, que mistura corrida em circuito com rally; Personalizado, que permite que você crie seu próprio jogo e tenha acesso a todo o conteúdo do game e também crie partidas multiplayer; e, por fim, Contra o Tempo, que é, basicamente, a leaderboard online para quem busca o desafio de postar os tempos mais rápidos nos trajetos do game.

Aqui vale apontar que o RallyCross é uma das experiências mais coesas que você terá no jogo logo de cara. Por se tratar de conteúdo licenciado, a maior parte dos carros que participa do campeonato atualmente, bem como as pistas mais populares, estão presentes no dia um. Fora que a modalidade é extremamente divertida, com corridas rápidas e frenéticas e com disputas de posição acontecendo a todo instante.

…Mas que precisa de mais conteúdo

Se no modo carreira você tem as melhorias como um aspecto motivador, adquirir e colecionar os carros também é algo muito satisfatório. De cara, são 50 modelos separados em 14 categorias diferentes, entre bólidos históricos de rally, modelos atuais, os novos Rally GT (que incluem carros como Camaro e Mustang) e os carros de RX. Apesar da quantidade satisfatória de veículos, a ausência de alguns modelos específicos é sentida.

No entanto, é na parte das pistas que a sensação de falta é mais forte: são apenas 6 localidades para rally com quase 80 estágios entre si e mais 8 pistas de rallycross. O problema é que alguns desses estágios são versões invertidas ou versões que incorporam múltiplos trechos de estágios anteriores.

A variedade de cenários é até satisfatória, com características bem marcantes entre si: as etapas com trechos extremamente rápidos da Polônia são brutalmente diferentes dos desfiladeiros rochosos e quase claustrofóbicos da Argentina, que por sua vez só guarda as pistas estreitas e curvas travadas com o cenário costeiro da Nova Zelândia.

Ainda assim, correr 6 estágios em cada localidade pode se tornar meio repetitivo. Além disso, localidades clássicas, como o País de Gales, Suécia e Monte Carlo acabam fazendo falta.

A Codemasters já anunciou pacotes de conteúdo, com mais carros e pistas, que serão disponibilizados para o futuro, mas, ainda assim, a estratégia pode ter sido justamente a causa de estranheza de que DiRT Rally 2.0 poderia muito bem ter oferecido mais logo de cara.

Uma performance visual  que cobra seu preço

DiRT Rally 2.0 faz uso da EGO Engine, velha conhecida da Codemasters que, mais uma vez, faz seu trabalho muito bem. Visualmente, o game é uma evolução de DiRT 4, mesmo que de forma sutil. Os carros estão brilhantemente modelados e os cenários também são riquíssimos em detalhes (algo muito importante no gênero). Alguns estágios, como é o caso da árida Argentina, são repletos de espectadores e a sensação de imersão visual é digno de destaque.

No entanto, nos consoles, a Codemasters mais uma vez priorizou os 60 frames por segundo – uma decisão sábia para um jogo que depende de precisão e fluidez. Isso, como em DiRT 4, fez com que alguns sacrifícios tivessem que ser feitos na parte visual nos consoles básicos (PS4 e Xbox One): alguns serrilhados aparecem, o jogo carece de alguns detalhes visuais e há casos de quedas leves na taxa de frames. Nada que prejudique a experiência, vale apontar.

No PS4 Pro, DiRT Rally 2.0 roda saudável e com uma qualidade levemente superior, mas é no Xbox One X que o bicho pega: o jogo vem com o selo de Xbox One X Enhanced e roda a 60 fps na resolução 4K sem abrir (muito) a mão da qualidade gráfica. No PC, o jogo apresentou algumas quedas pontuais com todos os gráficos no ultra em 1080p, mesmo com uma configuração relativamente forte.

No geral, a parte visual está muito bem feita e é extremamente satisfatória, mas cobra seu preço em termos de desempenho às vezes.

A cereja do bolo: a parte sonora

No entanto, a melhor parte de DiRT Rally 2.0 não pode ser sentida com as mãos e nem vista com os olhos: ela tem que ser ouvida. O trabalho de design de áudio feita no jogo não só é excelente como é, de longe, uma das melhores já vistas no gênero de corrida em muito tempo.

Desde a qualidade dos sons dos motores, a diferença na sonoridade do veículo dependendo da perspectiva que você o vê, até os detalhes minuciosos de som, como o icônico turbo flutter do Audi Quattro S1 do grupo B, as pedras batendo na lataria, os pneus deslizando na lama, o rangido das engrenagens de marcha e os estampidos dos backfires nas reduções… A Codemasters conseguiu transformar DiRT Rally 2.0 em uma experiência sensorial quase completa.

A desenvolvedora também agraciou o público brasileiro com um co-piloto/navegador com a voz autenticamente brasileira no lugar do gringo cheio de sotaque que fez o trabalho nos games anteriores. O trabalho foi feito por ninguém mais, ninguém menos que Wendel Bezerra – creditado como W. Becerra e que certamente vai render várias piadinhas envolvendo o Goku e o Bear Grylls. O também excelente Marcelo Salsicha dá a voz ao navegador de RallyCross.

Sim, o rei está de volta

Se existe algo que DiRT Rally 2.0 deixa claro é que uma Codemasters focada e que dá ouvidos à comunidade (que é fortíssima quando se trata de DiRT Rally) é uma Codemasters quase imbatível. A desenvolvedora conseguiu se recuperar de forma brilhante depois da escorregada em DiRT 4 e trouxe não apenas o melhor jogo de rally da atualidade, mas um dos jogos de corrida mais bem polidos no que diz respeito ao aspecto técnico.

O que a empresa conseguiu fazer na parte de jogabilidade e, principalmente, na parte sonora de seu novo jogo é algo que, mesmo em um jogo extremamente nichado, tem um impacto enorme no gênero de corrida como um todo.

A adaptabilidade dos controles, a qualidade do design de áudio, o capricho com que DiRT Rally 2.0 foi concebido só não o colocam definitivamente como um dos jogos de corrida mais importantes dos últimos anos porque, por uma decisão de marketing, a parte de conteúdo passa a sensação de que ainda faltam alguns detalhes para o jogo ser impecável. É valido apontar que a decisão de se distanciar daquele que deu origem à série causa estranheza, mas não tira, nem de longe, o brilho que DiRT Rally 2.0 conseguiu alcançar.

Posto isso, se você é fã de jogos de corrida e tem qualquer interesse na maravilhosa modalidade de rally, estamos falando de uma compra certa. Se você é mais casual no gênero, mas está em busca de uma experiência diferente e desafiadora – como a que é encontrada nos games do estilo soulsborne, por exemplo – não se deixe enganar pela cara de mau: DiRT Rally 2.0 pode ser uma experiência nada menos que extraordinária.

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Igor Napol, também conhecido como Piloto de Mentirinha, já fez parte do time do Voxel e agora toca seu canal no YouTube e no Twitch, trazendo conteúdos focados no gênero de corrida

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Pontos Positivos
  • Uma das experiências mais viscerais de rally dos últimos tempos, no volante ou no controle
  • Visualmente excelente, mesmo com alguns detalhes na performance
  • Parte sonora é uma das das melhores da história do gênero, incluindo localização em PT-BR
  • Modo carreira agora conta com um "plus", deixando a experiência menos crua
  • Quantidade satisfatória de veículos
Pontos Negativos
  • Quantidade de conteúdo deixa a sensação de que tem algo faltando
  • Apesar de não ser impeditivo para iniciantes e casuais, experiência podia ser mais convidativa e amigável
  • Cadência do modo carreira poderia ser customizável para evitar sensação de repetitividade