A ascensão dos jogadores midcore

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Estereótipos devem estar entre os expedientes culturais mais comuns. Nada como um bom rótulo para “resolver” rapidamente questões controversas, colocando tudo nos seus “devidos lugares” — de onde dificilmente alguém consegue sair, a menos que se debata bastante. Naturalmente, nos games isso não poderia ser diferente.

Não, não se trata aqui de mais uma discussão sobre os famigerados “istas” — aquele espécime curioso, sempre pronto a congregar em torno de bandeiras de consoles e desenvolvedoras de jogos, de onde passa então a arremessar pedras ou os próprios excrementos nos passantes. Mas, verdade seja dita, não se trata de uma questão menos controversa.

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Conforme o chamado “entretenimento” eletrônico passou a se difundir mais e mais como expressão cultural genuína, viu-se nascer uma polarização que persiste até hoje: aquele conhecido binário formado por jogadores “hardcore” e “casuais”. Mas há quem clame que há pelo menos mais uma categoria que deveria ser considerada nesse esquema básico. Uma classe um tanto impermeável a classificações fáceis, é verdade.

O público midcoreEm algum lugar entre o fanatismo e as pedrinhas coloridas

Sim, o espectro classificador de jogadores parece ser uma verdadeira “casa da mãe Joana”. Entretanto, considerando-se os inúmeros formatos de jogos atualmente disponíveis, assim como as variadas formas de envolvimento possíveis, talvez faça mesmo sentido imaginar um setor intermediário entre o jogador fanático e aquele que encara Candy Crush Saga na fila do supermercado.

O problema é que, embora a existência desse meio-termos seja praticamente um consenso hoje — tanto entre consumidores quanto entre desenvolvedores/produtores —, o mesmo não se pode dizer sobre o critério que serviria para definir esse povo da “coluna do meio”.


Afinal, o que define um jogador midcore? Será um jogador hardcore que, eventualmente, acabou tendo menos tempo para dedicar à sua amada jogatina? Ou, quem sabe, não se trata do típico jogador casual que, de repente, passou a exigir um pouco mais de imersão e profundidade dos seus jogos? Vale a pena olhar mais de perto.

Experiência imersiva e jogabilidade casual

Como não poderia ser diferente, a indústria é bastante pragmática ao descrever/catalogar os jogadores ditos midcore. Basicamente seria alguém que procura algo mais profundo em seus jogos — algo mais complexo do que arremessar passarinhos ou efetuar linhas de pedras coloridas —, embora não necessariamente tenham tempo para se dedicar a uma jogabilidade mais complexa.

Trata-se do que é chamado por alguns também de “geração easy mode” (modo fácil). São jogadores interessados em boas histórias, em periféricos novos e em jogabilidades ímpares... Eles não querem/não podem gastar muito tempo para dominar as mecânicas de jogo — de maneira que, na maioria dos casos, gastar várias horas para passar um chefe é algo completamente impensável.


Não tenho mais o tempo que tinha...

Dessa forma, talvez fosse possível reduzir o típico jogador mid-core a um hardcore que ficou mais velho, expandiu sua gama de experiências — tendo filhos, por exemplo — e, por conta disso, não consegue mais dedicar dezenas de horas semanais a um único jogo... Principalmente se ele não tiver um modo fácil.

Entretanto, a jogatina típica de um game entendido como “casual” normalmente não prende o midcore por muito tempo. Isso porque ele vem de um envolvimento mais profundo com os seus jogos. Isso deve continuar, mesmo que seja necessário driblar questões relacionadas ao tempo livre para os games.

Jogadores casuais atrás de “drogas mais fortes”?

Justiça seja feita: parece também perfeitamente razoável que grande parte dos jogadores que compõem o nicho midcore pode bem ser egressa das pedrinhas coloridas e dos passarinhos arremessáveis mencionados anteriormente.

Embora grande parte do público casual normalmente espere apenas pelo próximo joguinho descomprometido — do tipo que pode ser iniciado e largado sem grandes perdas —, deve haver uma parcela considerável que encontra em joguinhos simples de redes sociais ou celulares uma porta de entrada para experiências mais densas.

Mas isso provavelmente joga um novo inconveniente na hora de catalogar os midcore: por que eles não existiam antes? A resposta mais correta, provavelmente, seria: eles existiam. Mas algo parece ter fomentado a expansão que se vê atualmente nesse setor intermediário. Há quem coloque a responsabilidade nas novas ofertas tecnológicas, por exemplo.

Geração mobileAparelhos multifunção podem ser a resposta?

Falar do crescimento colossal do mercado mobile atual é praticamente “chover no molhado”. Basta olhar ao redor para encontrar alguém fuçando em alguma espécie de gadget — a fim de rodar aplicativos que, em grande parte dos casos, são jogos.

Entretanto, não é preciso ser nenhum gênio da tecnologia para perceber que os smartphones e afins de hoje oferecem uma plataforma muito mais convidativa para o desenvolvimento de jogos. Os tablets, em particular, mantêm o ideal de multifunção — que sempre vendeu aparatos do tipo — enquanto agrega tecnologia suficiente para rodar um belo jogo tridimensional, dependendo do modelo.

Há quem tenha encontrado ai a pedra angular, inclusive. “[A classe] midcore tem sido conduzida pela emergência dos tablets”, afirmou James Hursthouse, CEO e cofundador da Roadhouse Interactive, em entrevista ao site Polygon.

“É muito difícil dizer que você está imerso em um jogo ‘três em uma fileira’ como Candy Crush Saga, que é interessante por um lado, mas, ao mesmo tempo, ao se considerar uma experiência realmente imersiva, as telas grandes devem ser contempladas como parte do motivo para a emergência do midcore.”

O moderno “aparelho de TV”

Hursthouse compara o efeito dos tablets modernos àquele obtido pelas primeiras TVs de tela grande, às quais se pode ligar um console. Para ele, trata-se de levar a experiência de jogar em uma televisão para qualquer parte, a fim de cumprir as apertadas agendas de uma vida adulta.

“Eu acredito que seja mais o caso de pessoas que têm sido jogadores desde que eram crianças e que agora têm seus próprios filhos”, diz ele ao referido site. “Eles estão se tornando mais compromissados com o trabalho e não têm 20 horas ou mais por semana para dedicar a um game. Esses jogadores querem algo que possam apreciar em pequenas doses, por meio de um aparelho que esteja com eles o tempo todo.”

Fonte da imagem: Divulgação/Samsung

Uma experiência mais adulta

E o discurso tecnológico é endossado também por Ben Cousins, da DeNA. Para o desenvolvedor, a oferta de aparelhos mais poderosos tem possibilitado jogos com gráficos mais realistas e tom mais adulto — o que, em última análise, serviria para mover jogadores casuais e hardcore em direção ao setor midcore.

“Nos primeiros anos da App Store, havia mais jogos casuais baseados em ambientes 2D”, disse ele ao site Polygon. “Eu penso que as experiências mais hardcore têm se tornado possível por conta da tecnologia, e essa tendência deve continuar.” Para Cousins, a coisa nem mesmo deve parar no midcore.


“Acredito que nós passaremos do casual para o midcore e dali para o hardcore e para o ultra-hardcore e, ao final do dia, eu penso que os nossos aparelhos móveis possuirão jogos realmente hardcore como equivalentes a League of Legends ou World of Warcraft.”

De qualquer forma, não falta quem questione a ascensão casual ao midcore — e, sobretudo ao hardcore. Por outro lado, o nicho de jogos ditos “fitness” tem crescido exponencialmente... E, convenhamos, alguns deles dificilmente poderiam ser considerados como jogos. Bem, afinal, deve haver muito mais entre as pedrinhas coloridas e o completo envolvimento. Talvez alguém apareça com mais alguma categoria, vai saber.

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