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Ciência

Por que quase morrer é relatado como uma 'experiência feliz'?

Ainda é um mistério como o momento em que o cérebro luta para sobreviver é interpretado pela mente como algo positivo

schedule25/05/2020, às 18:00

Por que quase morrer é relatado como uma 'experiência feliz'?Fonte:  Getty Images/SDominick 

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Há muito que médicos e cientistas tentam entender o que são as Experiências de Quase Morte (EQMs) e por que elas são descritas como “felizes” ou “pacíficas”. A morte é assim tão doce? É isso que o neurocientista e cientista-chefe do Instituto Allen de Ciência do Cérebro, Christof Koch, quer descobrir. Para ele, a felicidade e a paz que pacientes experimentam frente à morte iminente tem uma resposta na biologia – ainda não se sabe qual. 

"Aceito a realidade dessas experiências intensamente sentidas. Como cientista, porém, sei que todos os nossos pensamentos, memórias, percepções e experiências são consequência inelutável da natureza do nosso cérebro, e não de qualquer agente sobrenatural. Por que a mente interpreta a luta para viver como positiva e feliz, em vez de indutora de pânico, permanece um mistério”, escreveu ele em um artigo na revista Scientific American.

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Segundo Koch, um em cada dez pacientes com parada cardíaca em ambiente hospitalar passa pela EQM, relatando ao acordar que flutuaram pela sala e voaram além, ou ainda caminharam em direção a uma luz brilhante (mas nem todos os relatos são felizes; segundo Koch, “alguns podem ser assustadores, marcados por intenso terror, angústia, solidão e desespero’”).

Apesar da crença geral que EQM são felizes, há relatos de experiências angustiantes e dolorosas.Apesar da crença geral que EQM são felizes, há relatos de experiências angustiantes e dolorosas.

Neurônios silenciam para poupar recursos

O processo por que passa nosso cérebro quando estamos morrendo é quimicamente angustiante. Quando o coração para, o cérebro deixa de receber oxigênio. Os neurônios, então, tentam impedir a inevitável morte que se aproxima, mesmo que o sistema que gera suas cargas elétrica fique cada vez mais difícil de ser mantido.

Sem oxigênio, os neurônios tentam a última cartada para evitar morrer. Como enviar sinais entre eles, como normalmente ocorre, torna-se um desperdício de recursos, então eles se "calam" e usam suas reservas de energia para manter suas cargas elétricas internas, esperando o retorno de um fluxo de sangue que nunca virá.

Ocorre então o que os neurocientistas chamam de "tsunami cerebral", quando o equilíbrio eletroquímico que mantém as células vivas entra em colapso e há grande liberação de calor, levando à destruição das células. A atividade elétrica silencia em todo o cérebro e a morte chega.

Desligamento do cérebro 

“Quando o coração para de bater, paciente não morreu, porque existe a ressuscitação cardiopulmonar. A morte moderna requer perda irreversível da função cerebral", diz Koch. Como uma cidade que fica sem luz um bairro por vez, as regiões do cérebro vão silenciando uma após a outra.

"A mente, com a energia que os neurônios ainda conseguem gerar, faz o que sempre faz: conta uma história moldada pela experiência, memória e expectativas culturais da pessoa”, escreveu o neurocientista.

EQM provocada

Não apenas pacientes em hospitais tiveram EQM: pilotos de teste da Força Aérea Americana e astronautas da NASA também foram afetados.

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Após desmaiarem ao treinar em simuladores de alta gravidade, eles relataram o que Koch chamou de “uma leve EQM": visão de túnel e luzes brilhantes, sensação de flutuação pacífica, experiências extracorpóreas, sensações de prazer e até euforia etc.

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“Neurocirurgiões são capazes de induzir sentimentos de êxtase ao estimular eletricamente uma parte do córtex em pacientes epiléticos com eletrodos implantados no cérebro.” O resultado é semelhante à EQM: em geral, felicidade e experiências extracorpóreas.

Segundo Koch, “esse vínculo entre padrões de atividade induzidos por um médico e a experiência vivida de quase morte fornece suporte para uma origem biológica, e não espiritual, das EQMs”.