Coluna do Carpe #19: jogos single-player ainda estão ameaçados?

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Muito se fala sobre o declínio dos jogos single-player e não é à toa. São inúmeros os casos de fracassos comerciais, estúdios fechados e prejuízos milionários. Enquanto isso, margens de lucro astronômicas em modelos que priorizam o multiplayer promovem uma adoção cada vez maior destas práticas por parte das publicadoras.

Por outro lado, alguns sucessos recentes entre os jogos single-player parecem provar o contrário. Cory Barlog, diretor de God of War, acredita que ainda há muito espaço para este tipo de jogo, comparando-os com uma fênix, que ressurge das cinzas como parte de um ciclo de altos e baixos.

Os jogos single-player permanecem ameaçados ou estamos realmente diante de um renascimento?

Refrescando a memória

Diversos jogos single-player estiveram – e ainda estão – em maus lençóis, principalmente por conta de seus grandes orçamentos e o retorno incerto. Máquinas mais poderosas possibilitaram jogos maiores, com gráficos incríveis, mas que, em contrapartida, demandam cada vez mais recursos e tempo de desenvolvimento de suas produtoras.

Os lucros simplesmente não cresceram na mesma proporção, e, para dificultar ainda mais o cenário, a concorrência é grande e os consumidores se mostram bastante exigentes, principalmente com relação ao polimento técnico e a quantidade de conteúdo ofertado.

O assunto veio a tona quando Phil Spencer, presidente da divisão Xbox, declarou ao The Guardian que jogos focados em história já não têm o mesmo impacto de antes, e que sua audiência não é tão consistente. Títulos como Horizon: Zero Dawn e Zelda: Breath of the Wild foram bem-sucedidos, mas tratam-se de exceções, cada vez mais raros diante da audiência gigante e crescente dos jogos-como-serviço.

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No ano passado, um jogo de Star Wars linear e focado na narrativa foi cancelado pela Eletronic Arts, e seu estúdio, a Visceral Games, fechado. Trata-se da conhecida equipe por trás da trilogia Dead Space e Dante’s Inferno. A justificativa da publicadora foi de que este game não se adequaria as novas demandas de seus fãs – deixando implícito que preferem apostar em modelos mais populares, com ênfase no multiplayer.

Segundo fontes internas, outra vítima da publicadora por motivos semelhantes foi a BioWare Montreal, com seu primeiro e único jogo, Mass Effect: Andromeda. Após a recepção morna do game, o estúdio foi dissolvido e a franquia Mass Effect colocada em um hiato por tempo indeterminado.

Estamos falando de estúdios e franquias de nome, gigantes de outrora que, por motivos parecidos, morreram ou tem seu futuro incerto

Não se tratam de acontecimentos isolados, envolvendo apenas a EA. Semelhantemente, a saga Deus Ex foi “colocada na geladeira” pela Square Enix, muito por conta do retorno mediano de Mankind Divided e a repercussão negativa de seu modelo de pré-venda.

Recentemente, a publicadora japonesa ainda se desfez da IO Interactive, estúdio comprado em 2009 e que, agora, é independente. São os criadores de Hitman, franquia que também já não pertence mais a Square Enix. A principal razão disso foi a decepcionante recepção comercial do último game da série, lançado em 2016.

Estamos falando de estúdios e franquias de nome, gigantes de outrora que, por motivos parecidos, morreram ou tem seu futuro incerto.

Ascensão do multiplayer

Enquanto isso, jogos multiplayer só crescem em adesão e lucratividade, tendência que provou-se não apenas um meio viável para retornar os altos investimentos no longo prazo como também verdadeiras minas de ouro, já que são muito populares entre os jogadores.

É impossível não mencionar o fenômeno battle royale. Playerunknown's Battlegrounds bateu todos os recordes possíveis na Steam, com mais de 3 milhões de jogadores simultâneos ainda em fase de acesso antecipado, enquanto que Fortnite, game mais jogado e assistido no momento, tem emplacado transmissões com mais de 500 mil pessoas na Twitch.

Estima-se que o jogo da Epic Games rendeu cerca de 300 milhões de dólares apenas em abril, dobro do mês anterior. A título de comparação, o lucro é superior ao da semana de abertura de Vingadores: Guerra Infinita, maior filme do ano. Detalhe: é um game gratuito, onde a monetização vem apenas de microtransações.

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Quanto ao já mencionado modelo de jogos-como-serviço, praticamente toda grande publicadora possui ou mais títulos com esta abordagem.

A Activision-Blizzard tem feito muito dinheiro com Destiny e Overwatch, e logo terão seu próprio battle royale em Call of Duty: Black Ops 4. A EA Games lucrou mais de 1 bilhão de dólares em 2016 apenas com microtransações, principalmente por conta de FIFA, e a próxima aposta da publicadora é Anthem, que seguirá estas mesmas tendências de monetização.

A Ubisoft está por trás de The Division, que logo receberá uma sequência, Rainbow Six: Siege e For Honor, enquanto que a Microsoft, dona do Xbox, tem Sea of Thieves, Gears of War 4 e Halo 5. Isso apenas para citar alguns exemplos.

Single-player e a fênix

No entanto, contra todas as previsões, alguns jogos single-player estão indo de vento em popa, batendo recordes e provando que ainda há demanda por games assim. God of War, por exemplo, vendeu 3 milhões de cópias em apenas três dias, estabelecendo o maior lançamento em toda a saga.

Zelda: Breath of the Wild bateu a impressionante marca de 10 milhões em abril deste ano, sendo o jogo mais vendido na história da franquia. O seu sucesso foi tão surpreendente que, por meses, haviam mais cópias da versão de Switch nas mãos dos consumidores do que consoles para jogá-los.

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Detroit: Become Human, lançado há poucos dias, também já é o maior lançamento da Quantic Dream, superando jogos como Fahrenheit: Indigo Prophecy, Heavy Rain e Beyond Two Souls.

Vitória garantida? Nem sempre

Enquanto isso, vários jogos multiplayer, mesmo seguindo fórmulas milionárias, fracassaram. Battleborn, da mesma equipe por trás de Borderlands, foi atropelado por seu concorrente direto, Overwatch. Já não recebe atualizações desde o final de 2017, sendo uma questão de tempo até que fechem seus servidores.

LawBreakers, outro concorrente do shooter de heróis da Blizzard, também sucumbiu, com pouquíssimos jogadores eu seu lançamento e que o abandonaram nas primeiras semanas. Seu estúdio até tentou emplacar Radical Heights, aproveitando a onda de battle royale, mas o fracasso se repetiu. A Boss Key Productions fechou as portas no mês passado.

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Ainda nesta semana, a Turtle Rock Studios, criadores de Left 4 Dead, anunciaram o fechamento dos servidores dedicados de Evolve. Lançado em 2015, nem mesmo a mudança para o modelo free-to-play foi o suficiente para salvar o jogo. Casos assim mostram que jogos multiplayer e monetização pensada a longo prazo nem sempre são sinônimos de êxito.

Qual é a resposta, então?

Isto tudo me leva a crer que há espaço no mercado para todos os tipos de jogos, multiplayer ou single-player, com a possibilidade de sucesso através de diferentes propostas. Entretanto, com um grande porém: é uma indústria extremamente competitiva, cada vez mais, e isso vale para todos.

Sempre houve e sempre haverá demanda por grandes produções single-player. Se é mais ou menos que no passado, pouco importa. A questão é que, para que um jogo desses dê certo, diversos fatores entram na brincadeira.

Data de lançamento, campanha de divulgação, implementação de DLCs e microtransações, polimento, inovação, qualidade técnica… são inúmeros os aspectos e detalhes que podem fazer a diferença entre um best-seller e um prejuízo milionário. Às vezes, um mínimo erro é fatal.

É uma indústria extremamente competitiva, cada vez mais, e isso vale para todos

Grandes produções single-player continuam arriscadas a maioria dos estúdios e publicadoras. No entanto, podem ser vistas como oportunidades, para atender a um público que, por vezes, é deixado de lado.

A verdade é que não há uma receita do sucesso: o mercado é altamente competitivo, impiedoso e imprevisível.

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