Deathbound: conheça o soulslike brasileiro que tem personagem que luta capoeira

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Imagem: Reprodução/Trialforge Studio

O gênero soulslike tomou conta do universo dos games desde o lançamento de Demon’s Souls, em 2009. Desde então, são diversos os títulos que têm dentre seus principais elementos a alta dificuldade, storytelling baseado em descrição de itens e chefões memoráveis.

E para dar frescor ao estilo tão homenageado nos últimos anos, um estúdio brasileiro decidiu colocar um tempero nacional na fórmula. Contendo até mesmo um personagem que luta capoeira, o game Deathbound é mais um concorrente a ganhar os corações de quem adora desafios.

Desenvolvido pela Trialforge, estúdio fundado no Rio de Janeiro, o jogo viralizou nas redes sociais e ganhou a atenção principalmente do público estrangeiro. A página oficial de Deathbound no X (antigo Twitter) já conta com quase 5,8 mil seguidores, para se ter uma noção.

E com uma ideia de homenagear não somente o Brasil mas diversas outras culturas, o game ainda terá outros diferenciais como personagens jogáveis femininos, absorvição da habilidade de outros guerreiros, combinação de estilos diferentes de luta e mais.

Para falar um pouco mais do projeto, o Voxel conversou com Ítalo Nievinski, cofundador da Trialforge. Dentre outros detalhes, ele pontuou que Deathbound ganhará uma demo jogável durante a Steam Fest (a partir de 5 de fevereiro) e que objetivo é lançar o título ainda em 2024.

Nievinski também falou sobre a trajetória da Trialforge, o estado do mercado brasileiro de games e até que Deathbound pode ganhar uma continuação (se o projeto for bem aceito pelo público). Confira, a seguir, os principais trechos da entrevista:

Voxel: Qual a trajetória da Trialforge? Como vocês começaram?

Ítalo Nievinski: A gente começou a se formar em 2013 na faculdade. Eu cursava matemática, mas tinha mais gente de ciências da computação. Alguém propôs começar a fazer um jogo e depois me chamaram. A gente começou a ver como fazia um jogo, já que não conhecíamos nada, e chegamos a produzir uns jogos para Android.

Também participamos de algumas game jams e fomos pegando experiência. Só que a gente queria fazer jogos mais complexos. Chegando lá em 2017 nós começamos a pensar em Deathbound. Ao longo do processo nós passamos em um edital no Rio de Janeiro para startups e o jogo recebeu um apoio financeiro da Secretaria de Tecnologia do Estado do Rio de Janeiro. Depois dali começamos a nos ver como uma empresa e adotamos o nome Trialforge.

Voxel: Quantas pessoas trabalham na Trialforge hoje em dia?

Ítalo Nievinski: Atualmente nós temos 20 pessoas trabalhando no projeto (Deathbound) internamente. Tem algumas coisas que fizemos outsourcing (terceirização), incluindo por intermédio da Publisher (Tate Multimedia), mas foi pouca coisa. Algumas pessoas estão menos próximas agora porque já concluímos algumas etapas.

Voxel: Como foi a questão financeira? Foi difícil tirar a ideia de Deathbound do papel por causa da dificuldade de financiamento?

Ítalo Nievinski: É um tópico complicado, já que aqui no Brasil não tem muitas empresas e investidores olhando para isso (desenvolvimento de jogos). Infelizmente é uma indústria que está formada lá fora, mas que no Brasil praticamente não existe. Por causa da falta de capital por aqui, o que muita gente faz é tentar fazer o pitch dos projetos fora do país.

Isso é uma pena porque parte dos recursos que poderiam ficar aqui acabam ficando lá fora, já que quem ganha a maior parte do dinheiro é quem investe. Em alguns momentos recentes tivemos ações de editais da Ancine e a indústria chegou a pensar que o cenário iria deslanchar, mas logo depois a Ancine teve um problema e desandou. Mas estamos com esperança porque agora parece que está começando a voltar a circular o dinheiro. E precisamos desse investimento recorrente.

Voxel: Como vocês enxergam a atual fase do setor de desenvolvimento de jogos brasileiros?

Ítalo Nievinski: A gente não consegue enxergar muito longe (a indústria de jogos do Brasil). Estamos trabalhando em uma coisa e torcendo para que a gente consiga emplacar um próximo projeto. Nós que estamos no nosso primeiro título relevante, que é Deathbound, não sabemos o que vai acontecer depois. Estamos buscando opções, mas não temos respostas. Eu acredito que muitas empresas estão passando pela mesma dificuldade. Não temos a oportunidade de fracassar e continuar pensando grande, então a insegurança financeira da nossa indústria acaba sendo um grande problema.

Voxel: E como surgiu a ideia de Deathbound, que é o primeiro grande projeto de vocês?

Ítalo Nievinski: Em 2017 a gente estava em uma vibe de Dark Souls e pensamos em fazer algo sobre isso, já que víamos valor no tipo de regra, na forma e dinâmica do jogo. A gente foi fazendo brainstorming e depois de muito tempo chegamos no que estamos fazendo hoje. Estudamos muito o gênero souls e entendemos o porquê de cada elemento.

Então o Deathbound tem muitos desses elementos, principalmente de Dark Souls e Elden Ring. Mas ele também escolhe se destacar e ir por caminhos diferentes para reforçar a mecânica principal que é o morphing (transformação dinâmica dos personagens). E a gente também tomou uma série de decisões de game design que se separam do gênero soulslike. Eu gosto desse trabalho que fizemos porque ele leva o Deathbound para um caminho que não é de cópia, mas é uma coisa que tem uma inspiração, que é baseada. A temática do jogo é vida e morte, por exemplo, já que absorvemos os personagens mortos. Também falamos sobre a psiquê humana e essa coisa de múltiplas personalidades em uma pessoa só etc.

Voxel: E qual o enredo de Deathbound?

Ítalo Nievinski: A nossa narrativa é bem completa. Trabalhamos na construção de um mundo que tem regras, reinos, religiões, cultos e etc. O jogo é ambientado em um mundo que passou por uma espécie de apocalipse que fez com os seres humanos voltassem para a era medieval, mas os cenários, não. Ou seja, é como se pessoas da época medieval, com espada e escudo, andassem no meio da Avenida Paulista com aquela estrutura urbana de prédios etc.

Eles são personagens em um mundo que se reergueu em uma cultura medieval, mas que durante o jogo você entra em cidades que eram modernas e foram abandonadas há muitos anos. Com um pouco mais de detalhes, a humanidade era imortal, construiu essas cidades e de um dia para o outro as pessoas passaram a ser mortais e a sociedade ruiu. Isso convergiu para os dogmas da igreja da morte e uma nova sociedade que abandonou a tecnologia antiga, já que é considerada heresia dos tempos da imortalidade.

Voxel: Os soulslike têm uma complicação no enredo, já que a história é contada muito através de descrições de itens, por exemplo. Como vocês vão lidar com essa questão? Deathbound terá história narrada ou nem tanto?

Ítalo Nievinski: A gente está com uma abordagem mista. Deathbound, diferente de outros souls, tem múltiplos personagens jogáveis e queremos trabalhar a personalidade deles. Cada um tem uma história, criação, o porquê ele é daquele jeito, como ele se relaciona com o que está acontecendo em Akratya (cidade onde se passa a história). E teremos cenas também. Mas a lore do mundo, os reinos, as facções, muito da história estará no cenário e nas descrições de itens. Nós criamos esse mundo rico e pretendemos utilizar em outros jogos, se tudo der certo. Nós queremos trabalhar mais em cima dessa IP (propriedade intelectual).

Voxel: O jogo terá cutscenes?

Ítalo Nievinski: Sim. Mas no geral, elas estarão relacionadas ao desenvolvimento da trama principal. Mas também teremos cenas in game com animações para mostrar o passado das pessoas. Então vamos misturar. As cutscenes também teremos em bosses, por exemplo, que é meio que a fórmula que vemos nos souls.

Voxel: Sobre a ideia de um personagem capoeirista que viralizou nas redes sociais. Nós sempre lembramos do Eddy Gordo...

Ítalo Nievinski: Ele é sempre muito mencionado porque nós temos poucos (personagens que lutam capoeira nos games).

DeathboundO personagem Mamdile de Deathbound utiliza a capoeira para atacar (Imagem: Divulgação/Trialforge)

Voxel: Pois é! E em um gênero de RPG de ação eu não lembro de nenhum outro personagem que tenha essas habilidades. De onde surgiu essa ideia?

Ítalo Nievinski: Eu lembro que tem um personagem do Fatal Fury, o Bob Wilson. Não é um jogo de aventura, mas é de luta. Mas realmente, não tem muitos. A ideia veio mais ou menos de uma brincadeira. Testamos movimentos de capoeira e falamos que ‘pô, bem que podíamos’ (colocar no jogo). A ideia foi crescendo e aos poucos fomos levando mais a sério. É super normal a gente ver um personagem de games lutando kung-fu, karatê, essas coisas. E capoeira também é maneiríssima, então por que não colocar? Eu não tenho nenhuma relação com a capoeira e nem temos capoeiristas na equipe. Mas todos apreciamos e vemos o valor disso como sendo parte da nossa cultura.

Voxel: E quais outros elementos da cultura brasileira existem em Deathbound?

Ítalo Nievinski: Muita gente que vai fazer um jogo no Brasil pensa em algo enraizado na nossa cultura. No nosso caso, a gente não foi por esse caminho. (Deathbound) bate mais com a cultura medieval europeia. Só que a gente conseguiu ir abrangendo um pouco mais. Então incluímos cultura africana e asiática também. A capoeira e o nosso personagem Mamdile é resultado disso, de pensarmos em prezar pela cultura brasileira e do mundo todo, não ficar centrado naquilo que a gente vê o tempo todo como a cultura mainstream dos Estados Unidos.

E eu acho que nosso jogo tem um potencial cultural e histórico muito legal.  Outra coisa que prezamos foi a diversidade. Nós já mostramos sete personagens jogáveis sendo um cavaleiro europeu, a Olivia que é uma mulher negra com idade avançada, a Yulia que também é negra, um personagem baseado na cultura asiática... A gente também teve uma grande preocupação com a diversidade.

Voxel: Deathbound está em qual fase de desenvolvimento?

Ítalo Nievinski: A gente está se aproximando do alfa do jogo. Estamos perto de ter o jogo do início ao fim funcionando para podermos entrar na etapa de polimento final, melhorias e bug fixing para o jogo ficar pronto para o mercado. Eu diria que talvez tenhamos passado de uns 75% do projeto, considerando desde o período que recebemos o investimento.

Voxel: E a expectativa é de lançar Deathbound em 2024, correto? Qual a janela de lançamento?

Ítalo Nievinski: Pretendemos lançar em 2024, mas não temos nenhuma janela específica que eu possa comentar. Temos algumas ideias baseadas em movimentos do mercado, mas ainda não tenho um período muito certo.

Voxel: Na Steam é mostrado que Deathbound terá interface em português do Brasil, mas a dublagem somente em inglês. Por que vocês tomaram essa decisão?

Ítalo Nievinski: A dublagem em português é uma coisa que eu quero muito, mas ainda não está confirmada. Ainda que não tenha no lançamento, a gente pode colocar assim que pudermos. Eu quero muito que Deathbound tenha dublagem em português, mas foi um pouco difícil encaixar na agenda de desenvolvimento e na questão financeira. Então nesse primeiro momento vamos focar em fazer que ele fique muito bem no inglês. Infelizmente não pudemos priorizar a dublagem em português porque temos um foco internacional, já que para a gente seria um prejuízo fazer somente o português. E entre um e outro, nós priorizamos o inglês porque vai abrir mais portas para a gente.

Voxel: E vocês estão focando na comunicação em inglês porque a ideia é alcançar uma audiência maior?

Ítalo Nievinski: Deathbound é um projeto grandinho, então a gente precisa alcançar um público mais amplo. O jogo vai ter localização em várias línguas porque queremos atingir vários lugares. Nós precisamos que o jogo faça sucesso dentro e fora do Brasil e quanto mais longe a gente chegar, mais se converte em possibilidades de fazer mais jogos no futuro.

Voxel: Deathbound tem confirmação para chegar somente ao PC por enquanto. Ele poderá ser lançado nos consoles também?

Ítalo Nievinski: A gente também quer ver o jogo nos consoles porque tem tudo a ver com a nossa trajetória como jogadores e com a nossa história de vida. Eu não descarto Deathbound nos consoles até porque ele foi pensado para rodar em PC e consoles do ponto de vista de input e tudo mais. No entanto, tem a questão também de capital para investir nisso e a parte técnica, já que lançar junto é difícil. Não sabemos se vai ser possível, mas estamos trabalhando para que isso aconteça.

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