Bem-Vindos ao Clube da Sedução conta a história do Chippendales (crítica)

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Há um nicho muito interessante nas séries norte-americanas que visa recapitular fatos importantes, mas não necessariamente históricos, do passado recente do país. Dentro dessa leva, dá para encaixar as grandiosas temporadas de American Crime Story, do showrunner Ryan Murphy (que contaram o julgamento de O.J. Simpson, o assassinato de Gianni Versace e o escândalo político envolvendo Monica Lewinsky e o então presidente Bill Clinton).

Mas não são apenas essas séries incensadas que alimentam este nicho. Há uma ascensão de narrativas audiovisuais não tão famosas, mas que buscam recontar, com bastante competência, casos que impactaram a cultura. E é aqui que encaixo Bem-Vindos ao Clube de Sedução – nome que traduz pessimamente o título original Welcome to Chippendales, série da Starplus. Ele conta a construção de uma empresa bastante inusitada: o Chippendales, uma rede de boates de striptease masculino fundada em 1979 por um imigrante indiano chamado Steve Banerjee.

Mas espere menos foco na “sedução” do título e mais em uma exploração bastante interessante sobre racismo, ganância, e sobre como o dinheiro pode funcionar como uma espécie de “demônio” que escraviza os mais ambiciosos. E se este pequeno enredo parece a você difícil de acreditar, saiba que esta é uma série true crime, ou seja, baseada em um caso criminal que realmente aconteceu.

Poder, cobiça e homens nus

Bem-Vindos ao Clube de Sedução inicia-se ainda nos anos 1970, quando um sujeito chamado Somen Banerjee (vivido por Kumail Nanjiani, da série Silicon Valley) aparece trabalhando como um funcionário de um mercadinho em um posto de gasolina. Lá, ele é submetido a todo tipo de humilhação por parte dos clientes, motivada por xenofobia em razão de sua origem indiana. Esta informação, posta já nas primeiras cenas, é importante, pois se conecta com todo o desdobramento seguinte da série.

Ocorre que Somen, claramente, tem tino para os negócios. Seu chefe no posto quer promovê-lo a gerente, mas ele não aceita, já que tem planos mais altos. Sendo alguém que migrou para a América a contragosto dos pais, é muito importante para conseguir construir o seu próprio negócio, para que então possa voltar bem-sucedido para Bombaim.

Ocorre que seus modelos de sucesso se centram na opulência e na vida de prazeres representada pelo mundo da Playboy, na figura do seu dono, Hugh Hefner, que Somen idolatra. Ou seja, Banerjee não quer apenas ficar rico. Ele quer ser reconhecido como rico e quer desfrutar de um novo patamar social que não é autorizado aos imigrantes na América – sobretudo, aos que são vistos sob o estigma racial de suas cores de pele.

Isto posto, fica claro que Bem-Vindos ao Clube de Sedução carrega um forte discurso sobre as injustiças sociais que cercam a população de um país que se orgulha de dar a mesma chance para todos. Para realizar seu sonho, Somen muda seu nome (passa a usar Steve, mais americano) e irá fazer coisas bastante horríveis. Mas, para galgar seu objetivo, inicialmente decide abrir um clube de gamão, que não dá certo.

Depois de várias tentativas para mudar de negócio, todas sem sucesso, ele finalmente tem um insight. Um indivíduo que se aproxima do seu clube e que se apresenta como promoter de boates o leva, junto da mulher (uma coelhinha da Playboy chamada Dorothy Stratten, que foi assassinada pelo mesmo marido em 1980) a um bar gay, onde eles veem um show de striptease masculino em que as mulheres parecem estar enlouquecidas.

Steve Banerjee chega, então, a uma inusitada fórmula de sucesso: ele resolve abrir um “clube das mulheres” (remeto aqui ao termo com que esse tipo de boate ficou famoso aqui no Brasil) dedicado à classe média e alta feminina na Costa Leste, onde elas poderiam se regozijar vendo homens se despirem e apalpando seus corpos. Nasce, então, o Chippendales.

Sucesso e tragédia no Chippendales

(Fonte: StarPlus)(Fonte: StarPlus)Fonte:  StarPlus 

O contexto, portanto, é o de um momento histórico em que há movimentos gradativos de liberação sexual e de empoderamento das mulheres. Mas aos poucos fica claro que Steve Banerjee, mesmo que ele mesmo seja alvo de todo tipo de preconceito, está interessado em focar em algo chique, para pessoas "diferenciadas".

O Chippendales aos poucos vai crescendo e fazendo muito sucesso, o que atrai novas pessoas para dentro do mundo do controlador Steve. Uma delas é Irene (vivida pela competente Annaleigh Ashford, que tem um papel importante em American Crime Story – Impeachment), uma contadora que acaba se tornando sua esposa. E a outra é o coreógrafo Nick De Noia (papel de Murray Barlett, que angariou fama ao viver o icônico gerente de resort em The White Lotus).

De Noia (que se vangloria de não ter um, mais dois prêmios Emmy), em especial, aproxima-se do Chippendales com uma promessa de aprimorar o produto que Banerjee está vendendo: ele considera os shows de striptease muito amadores e vulgares. Seu talento na dança e na performance se tornm a chave para que o clube possa se tornar mais respeitado pelas elites. Junto a ele, surge também na trama uma mulher chamada Denise (papel de Juliette Lewis), que é uma costureira que traz um olhar mais especializado para as roupas dos dançarinos.

Ao agrupar esta equipe – que, em certo momento, se autointitula de “os quatro gênios”- o Chippendales parece ter achado a fórmula infalível para o sucesso e para a geração de uma fortuna jamais sonhada por nenhum deles. Mas o sonho é atingido muito rápido e, por conta disso, a queda em seguida é inevitável.

Não entrarei em detalhes para não dar spoilers a quem não conhece a história. Mas destaco apenas que tudo o que acontece parece ter a ver com a personalidade de Steve Banerjee, um sujeito complexo, que transita entre uma gigantesca (mas justificável) sensação de inferioridade e um desejo cego por poder.

A série explora de maneira inteligente estas características em certos momentos – como, por exemplo, quando Steve encomenda um terno e insiste ao alfaiate para que encurte as mangas, por mais que o homem insista que vá ficar deselegante (seu objetivo é que seu Rolex ficasse sempre à mostra).

Contudo, senti que as falhas de Bem-Vindos ao Clube de Sedução estão justamente na falta de sutileza de modo geral. No primeiro episódio, em específico, há um esforço mal engendrado de didatismo em várias cenas em que Banerjee descreve a outros personagens, de uma maneira nada natural, cada detalhe do jeito que pensa os negócios ou sobre onde quer chegar. Estas primeiras cenas em nada se conectam com o empresário meio soturno que é mostrado no resto da série.

Para quem não vai assistir esperando a série do ano, a história do Chippendales pode ser uma boa diversão. E, por fim, preste atenção na capacidade que o australiano Murray Bartley tem de roubar a cena nas séries em que participa. Foi assim em The White Lotus e ele faz assim novamente em Bem-Vindos ao Clube de Sedução. É realmente uma estrela.

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