O Ensaio, da HBO, é a série mais maluca que você vai assistir (crítica)

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Os catálogos de streaming estão repletos de opções de séries – muito mais do que qualquer um consegue acompanhar. Nossas decisões sobre quais vamos assistir costumam envolver um reconhecimento sobre o gênero: há os que preferem sitcoms, thrillers, tramas médicas, séries de horror, reality shows, dentre tantos outros.

Começar a falar sobre O Ensaio, atração presente no cardápio do HBO Max, é um desafio imenso. Como poderíamos descrever essa série criada pelo comediante (?) Nathan Fielder, que não arranca gargalhadas do público? Já que os participantes são – fora os atores – pessoas reais, daria para categorizar como um reality show ou como um documentário?

Assistir aos episódios de O Ensaio não é suficiente para solucionar essas dúvidas. Mas uma tentativa de apresentação desta série talvez pudesse ser: nela, Nathan Fielder convida pessoas para “ensaiarem” uma situação difícil antes de vivenciá-la de fato. No primeiro episódio, por exemplo, um sujeito tem um certo sofrimento porque “mente” para uma amiga com quem participa de uma equipe em que competem em um campeonato de trívia, dentro de um bar. A mentira? Ele deu a entender que tinha um mestrado, mas na verdade só completou a graduação.

Um sofrimento pequeno, talvez, ao olhar de alguns (não são assim todas as neuroses?), mas que é levado a sério em O Ensaio. A equipe de Nathan Fielder contrata vários atores e cria um sofisticado mise-en-scène para representar o cara, sua amiga e a situação.

A atriz que a interpreta, aliás, dá um jeito de conhecer o “alvo” na surdina para conseguir captar alguns trejeitos dela para poder representá-la melhor. Na sequência, dentro de um estúdio da HBO, a produção monta uma réplica perfeita do bar para que o homem sofredor possa realizar o ensaio junto de Fielder antes de partir finalmente para o “confronto”.

Ao fim do primeiro episódio, talvez surja no espectador a questão: para que tudo isso? E é aí que as coisas começam a se complicar.

O mundo como um palco

(Fonte: HBO)(Fonte: HBO)Fonte:  HBO 

Há uma frase muito famosa creditada a William Shakespeare que diz assim: “o mundo inteiro é um palco e todos os homens e mulheres não passam de meros atores”. Embora seja uma ideia complexa para ser abordada em curtas linhas, há aqui a proposta de que a vida cotidiana é sempre “encenação”- que não pode, de forma alguma, ser aqui confundida com a mentira.

Desde o momento que acordamos, desempenhamos uma série de papéis, como de pai, marido, namorado, filho, colega de trabalho, chefe. A vida social só é possível à medida que esses papéis são reconhecidos pelos outros – o que acontece, claro, se conseguimos cumprir a contento as nossas performances.

O Ensaio traz uma proposta ousada: já que temos que aprender na marra a ser cada uma dessas coisas, que tal se houvesse um ensaio? A ideia um tanto louca (e aparentemente sem sentido, mas talvez nem tanto assim) é que inspira Nathan Fielder a montar esta série e a convidar alguns voluntários a participar. Além do homem que quer contar a verdade para a amiga, há um outro que está chateado com o irmão que não libera a herança do avô porque acha que a namorada dele é uma golpista.

A questão aqui – e que talvez faça com que a série caminhe sempre na corda bamba entre o humor, o drama e a mera bisbilhotice – é que o “ensaio” vai escalonando, num vórtice um tanto maluco que parece nos carregar para dentro da intrincada mente de Nathan Fielder.

Para ensaiar o confronto do rapaz com o seu irmão, Nathan escala o seu avô como ator, um idoso de saúde fragilizada que necessita de cuidados. E a necessidade de outros ensaios para outras situações acaba fazendo com que Nathan Fielder treine atores para que cumpram o desafio de se tornarem outras pessoas, dentro do que vai chamar de “método Fielder de atuação".

Contudo, o ápice de O Ensaio chegará quando ele resolve “ajudar” Angela, uma mulher cristã solteira na casa dos 40 anos cujo principal objetivo de vida é casar e ter filhos. Nathan resolve proporcionar a ela a sensação desta experiência, para a qual não há qualquer ensaio possível.

A produção monta todo o cenário à altura dos mais altos sonhos de Angela: ela quer morar em uma casa de campo, em que plante a própria comida, viva do próprio negócio e dependa pouco do mundo externo. Para dar conta disso, ela topa morar por meses em uma casa alugada, e a produção contrata atores infantis que possibilitarão a ela vivenciar a rotina de criar um bebê desde pequeno até o momento em que o filho completar 18 anos.

Como aqui é vida real – na medida em que tudo isso pode ser real – é claro que a grande graça da série surgirá daquilo que não se pode controlar. Só que isso não envolve as reações apenas de Angela, mas as do próprio Nathan.

Um comediante que não faz rir

(Fonte: HBO)(Fonte: HBO)Fonte:  HBO 

Desconhecido de boa parte do público brasileiro, o canadense Nathan Fielder é um comediante bastante peculiar, que ganhou fama entre os americanos com o programa Nathan for you, da Comedy Central.

Seu estilo se situa, conforme apontado pela crítica, dentro daquilo que se costuma chamar de cringe comedy, um tipo de comédia baseado no contato com situações constrangedoras (pense, por exemplo, em por que The Office nos faz rir). A nós, os espectadores, sobra um certo papel de voyeur, no sentido de que nos divertimos com as situações justamente porque elas não estão ocorrendo conosco.

A própria persona de Nathan Fielder tem algo de embaraçosa. Nosso primeiro contato com ele evidencia um homem que parece meio inexpressivo e ensimesmado, cuja voz tem um tom sem ritmo, lembrando um pouco a voz de robô do Google. É este sujeito estranho que se incumbe da responsabilidade de interferir em aspectos delicados da vida de pessoas aleatórias, que confiam nele (ou na HBO) para ter uma experiência que, em vários sentidos, cobra um preço caro.

Mas a grande sacada ao longo dos episódios é que, aos poucos, começamos a notar que o verdadeiro “ensaio” é o do próprio Nathan, que se confronta o tempo todo com questões internas e questiona certezas que tinha sobre si mesmo - inclusive sobre suas noções de ética. A graça de O Ensaio é justamente possibilitar que se vá “pescando” um pouco do que há em comum entre as vidas por estas experiências.

Se viver não é fácil (e se, por vezes, dá até um desejo de que pudéssemos “treinar” para as situações difíceis que estamos prestes a experimentar) O Ensaio, da HBO, não deixa de ser um convite para encarar que não há como fazer isso. Por mais clichê que isto soe, viver só se aprende vivendo – e é exatamente isso que parece sugerir esta série maluca que promete ficar habitando a sua mente por dias.

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