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O Irlandês mostra um Scorsese melancólico e reflexivo (Crítica)

19/11/2019, às 21:15

<p>Um olhar desatento pode induzir o espectador ao erro de achar que <em>O Irland&ecirc;s</em> se parece com os filmes de m&aacute;fia que colocaram a carreira de Martin Scorsese nos trilhos nos anos de 1990, como <em>Os Bons Companheiros</em> (1990) e <em>Cassino</em> (1995) &ndash; suas obras da d&eacute;cada anterior s&atilde;o &oacute;timas, evidentemente, mas foram mal recebidas pelo p&uacute;blico o que, combinado com um v&iacute;cio em drogas, deixou sua carreira em maus len&ccedil;&oacute;is. A produ&ccedil;&atilde;o da Netflix, em exibi&ccedil;&atilde;o em cinemas selecionados, lembra muito estes dois filmes. Est&aacute; tudo l&aacute;, do elenco aos temas, com uma diferen&ccedil;a: Scorsese agora est&aacute; 30 anos mais velho, o que lhe d&aacute; uma certa perspectiva.</p>
<p>No filme Robert De Niro, o mais frequente dos colaboradores de Scorsese, encarna Frank &ldquo;O Irland&ecirc;s&rdquo; Sheeran, um ex combatente da Segunda Guerra Mundial que trabalha como motorista de caminh&atilde;o. Sua vida se cruza com a de Russell Buffalino, papel de Joe Pesci &ndash; que deixou a aposentadoria especialmente para esse papel &ndash;, um chef&atilde;o da m&aacute;fia italiana, que o coloca nas gra&ccedil;as de Jimmy Hoffa, interpretado por Al Pacino, o presidente nacional do sindicato dos caminhoneiros e um dos mais poderosos homens da am&eacute;rica nas d&eacute;cadas de 60 e 70. Outros velhos conhecidos do c&acirc;none do diretor tamb&eacute;m est&atilde;o l&aacute;, como Harvey Keitel e Ray Romano ou Bobby Cannavale, estes dois &uacute;ltimos egressos das s&eacute;ries de TV que Scorsese produziu para a HBO.</p>
<figure class="image align-center"><img src="https://tm.ibxk.com.br/2019/11/15/15183439724401.jpg" alt="" width="3000" height="1622" />
<figcaption>Pacino e De Niro em <em>O Irland&ecirc;s</em> (Divulga&ccedil;&atilde;o / Netflix)</figcaption>
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<p>A narrativa sem pressa, com De Niro narrando os acontecimentos e nos guiando pela trama enquanto acompanhamos o desenrolar dos acontecimentos, parece evocar o esp&iacute;rito de <em>Os Bons Companheiros</em>, de fato. Com a diferen&ccedil;a central de que <em>O Irland&ecirc;s</em> &eacute; mais afetado pelos acontecimentos reais, como a elei&ccedil;&atilde;o e assassinato de John F. Kennedy e o caso Watergate. S&atilde;o quest&otilde;es importantes, j&aacute; que Hoffa, Sheeran e Buffalino s&atilde;o figuras importantes na hist&oacute;ria mais ou menos recente dos EUA, ainda que, como o pr&oacute;prio Scorsese faz quest&atilde;o de frisar ao final do filme, j&aacute; estejam absolutamente esquecidas.</p>
<p>A no&ccedil;&atilde;o de &ldquo;esquecimento&rdquo; &eacute; central para a estrutura que Scorsese prop&otilde;e. <em>O Irland&ecirc;s</em> &eacute; contado do ponto de vista de um velho e debilitado Sheeran, que reflete sobre sua vida, os m&uacute;ltiplos assassinatos, a escalada pelo poder, o conflito entre os interesses dos grupos mafiosos e a ambi&ccedil;&atilde;o pol&iacute;tica dos sindicatos, nem sempre coincidentes, quase sempre conflituosas. Como em toda a obra do cineasta, n&atilde;o h&aacute; mocinhos ou bandidos, mas sim seres humanos falhos em sua totalidade. Ao incluir a perspectiva de um moribundo, por&eacute;m, Scorsese questiona n&atilde;o apenas a vida do personagem, mas a pr&oacute;pria no&ccedil;&atilde;o de exist&ecirc;ncia, informada, claro, pelo cristianismo que marca sua obra.</p>
<figure class="image align-center"><img src="https://tm.ibxk.com.br/2019/11/15/15183527428402.jpg" alt="" width="3000" height="1622" />
<figcaption>Pacino e De Niro em <em>O Irland&ecirc;s</em> (Divulga&ccedil;&atilde;o / Netflix)</figcaption>
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<p>O que de fato importa na vida? Parece se perguntar Scorsese. Qual &eacute; o legado real de um homem que abra&ccedil;ou a viol&ecirc;ncia como forma de express&atilde;o e usou sua fam&iacute;lia como desculpa para exerc&ecirc;-la quase indiscriminadamente? Da&iacute; a import&acirc;ncia de acompanhar a trajet&oacute;ria de Sheeran e n&atilde;o Hoffa, Buffalino ou outra figura que em tese seria mais importante para a hist&oacute;ria &ndash; Hoffa, inclusive, j&aacute; foi biografado em <em>Hoffa &ndash; Um Homem, Uma Lenda</em> (1992), dirigido por Danny DeVito, com Jack Nicholson no papel central. O personagem de De Niro reenquadra a glamuriza&ccedil;&atilde;o que o cinema faz da viol&ecirc;ncia e estilo de vida da m&aacute;fia desde antes de <em>Scarface: a Vergonha de uma Na&ccedil;&atilde;o</em> (1932), de Howard Hawks. &Eacute; quase como se <em>O Irland&ecirc;s</em> fosse uma esp&eacute;cie de anti filme de m&aacute;fia.</p>
<p>O curioso, afinal, &eacute; que <em>O Irland&ecirc;s</em> parece s&oacute; poss&iacute;vel de ser feito pelas m&atilde;os de um cineasta que j&aacute; viveu tudo o que Scorsese viveu. Ao mesmo tempo, h&aacute; uma vibra&ccedil;&atilde;o e apre&ccedil;o pela tecnologia que s&atilde;o comuns em cineastas mais jovens. Muito do &ecirc;xito do filme, por exemplo, est&aacute; no uso de m&aacute;scaras digitais que rejuvenescem e envelhecem De Niro, Pesci e Pacino ao sabor das necessidades da trama. Nas m&atilde;os de qualquer outro, este recurso iria distrair o espectador, comprometendo a imers&atilde;o na trama. Especialmente em 3h30 de proje&ccedil;&atilde;o. Nas m&atilde;os de Scorsese, temos um &eacute;pico como pouco se v&ecirc; no cinema.</p>
<p><em>Por Luiz Gustavo Vilela via nexperts.</em></p>

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