Crítica: 1917 mostra Primeira Guerra em tomada única

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Dois soldados, durante um dos muitos impasses que marcou a Primeira Guerra Mundial, recebem uma missão de atravessar as linhas inimigas e, antes do amanhecer, evitar que um batalhão do exército britânico avance sobre a linha alemã. A premissa simples, quase fugidia, dá sustentação para o curioso exercício de estilo que é 1917, primeiro filme de Sam Mendes depois de passar pelos dois últimos James Bond´s, reatando a parceria com o diretor de fotografia Roger Deakins – que se iniciou com um outro filme de guerra: Soldado Anônimo, de 2005.


O truque de 1917 está em sua aparente tomada única, emulando o que até hoje só foi conquistado por Aleksandr Sokurov em Arca Russa, de 2002, único filme todo captado em uma sequência ininterrupta. Mendes e Deakins, inclusive por uma questão de logística, usam o método de Alejandro Gonzalez Iñarritu em Birdman, de 2014, em que os cortes são mascarados digitalmente, permitindo que a produção aconteça em etapas, ao longo de vários dias. Diferente do trabalho de Iñarritu, porém, 1917 acontece sem saltos temporais. E isso faz toda a diferença.

Dupla de soldados encara lama em 1917 (Divulgação/Universal)


O efeito final, além de alguns momentos de deleite visual, como é comum no trabalho de Deakins, é o de atrelar o tempo de exibição ao tempo dramático. Ou seja, nós, espectadores, estamos experimentando o filme junto dos dois soldados. Tudo o que sabemos sobre cada novo passo, sobre cada novo cenário, sobre cada surpresa que se esconde nas sombras, é exatamente o que a dupla sabe. Só iremos saber algo novo quando eles também descobrirem isso. Enquanto proposta de imersão, talvez seja o mais próximo que o cinema consiga chegar de um videogame.


A, digamos, estética gamer de 1917 combinada com as necessidades dramáticas do cinema hollywoodiano são uma combinação perigosa. Para evitar que o espectador se sinta entediado com o que potencialmente seria apenas dois soldados caminhando, exaustos, tensos e esfomeados, Mendes – estreando na escrita de roteiros – aposta em uma sucessão de acontecimentos dramáticos e de ação. Como acontece em um jogo: os personagens recebem uma missão e saltam de desafio em desafio até que a história se acabe.

Europa rural é devastada pela guerra (Universal/Divulgação)


Esta escolha reduz um pouco o sentimento de horror que é geralmente evocado nos poucos filmes sobre a primeira guerra mundial que ainda circulam entre as rodas cinéfilas. De um lado, é proposital. Mendes quer quebrar com o que se tornou o clichê de que o conflito se deu por uma combinação de soldados aterrorizados e oficiais deslumbrados com medalhas e promoções sem precisar pisar no front – clichê solidificado por Stanley Kubrick em Glória Feita de Sangue, de 1957, cujas tomadas nas trincheiras são devidamente referenciadas por 1917. De outro, é um subproduto da relação afetiva do diretor com a história.


Todo o filme 1917 é uma homenagem a Alfred H. Mendes, avô do diretor, que lutou junto aos britânicos na Primeira Grande Guerra. Daí, em parte, a necessidade de Mendes de assumir pela primeira vez em sua carreira a autoria do roteiro – escrito à quatro mãos com Krysty Wilson-Cairns. Por isso o resultado é menos político (e, portanto, menos potente), e mais agridoce, tom encapsulado na sequência em que uma tropa britânica se prepara para a batalha enquanto ouvem um de seus membros cantar uma tradicional música folclórica (The Wayfaring Stranger). Se falta verdade histórica, sobra afeto.

Este texto foi escrito por Luiz Gustavo Vilela Teixeira via nexperts.

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