Google x DOJ: confira o resumão da treta que pode acabar com o monopólio da gigante das buscas
O Google foi considerada monopolista pela justiça dos Estados Unidos, e agora terá que atender às ordens do governo para restabelecer o equilíbrio do mercado

31/05/2025, às 14:00
Atualizado em 02/06/2025, às 13:47
O Google está no centro de um dos imbróglios judiciais mais graves de sua história — e cujas consequências podem impactar toda a internet. Agora, já nos estágios finais da disputa, o mundo se prepara para descobrir o que a Gigante das Buscas terá que fazer para restaurar a competitividade no setor de buscas.
Tudo começou em 2020, quando o Departamento de Justiça dos Estados Unidos (DOJ) acusou o Google de violar a Lei Antitruste Sherman, de 1890. Segundo o processo, a empresa teria monopolizado os mercados de buscas e publicidade online, principalmente em dispositivos Android.
A Lei Sherman, batizada com o nome de seu autor, John Sherman, proíbe acordos anticompetitivos e práticas unilaterais que levem à formação de monopólios. O pacote legal também dá ao DOJ poder para mover ações contra estratégias que violem esses princípios.

A ação foi movida em conjunto com procuradorias de estados como Arkansas, Flórida, Geórgia, Indiana, Kentucky, Louisiana, Mississippi, Missouri, Montana, Carolina do Sul e Texas. O julgamento teve início em setembro de 2023, sob responsabilidade do juiz federal Amit Mehta, no Tribunal Distrital do Distrito de Columbia.
Qual é a acusação contra o Google?
O DOJ alega que o Google abusou de sua posição dominante no mercado de buscas ao firmar acordos comerciais anticompetitivos com empresas como Apple e operadoras de telefonia. Com essas parcerias, a empresa teria garantido 88% do mercado de buscas online nos EUA.
Além disso, o processo afirma que o Google também monopolizou o mercado de publicidade online, ofuscando completamente seus concorrentes. Segundo estimativas do governo, a empresa controla cerca de 70% desse setor.
“Há duas décadas, o Google era a queridinha do Vale do Silício, uma startup improvisada com uma proposta inovadora para buscas na internet”, diz o texto da acusação. “Hoje, é um guardião monopolista da internet, uma das companhias mais ricas do planeta, com valor de mercado de US$ 1 trilhão e lucros anuais superiores a US$ 160 bilhões. Por anos, o Google usou estratégias anticompetitivas para manter e expandir seus monopólios — nas buscas, na publicidade de buscas e nos anúncios em texto, que sustentam seu império.”
Google ganha em ser conveniente
Para o DOJ, um dos métodos mais eficazes para manter a dominância de um buscador é torná-lo o padrão em dispositivos e navegadores — reduzindo o esforço necessário do usuário para usar o serviço.

“Mesmo quando os usuários podem mudar o buscador padrão, raramente o fazem”, afirma o DOJ. A acusação cita acordos de exclusividade firmados com fabricantes como Apple, LG, Motorola e Samsung; operadoras como AT&T, T-Mobile e Verizon; e desenvolvedores de navegadores como Mozilla, Opera e UCWeb.
Muitos desses contratos envolvem cifras bilionárias — como o acordo para manter o Google como buscador padrão no Safari.
Justiça reconhece monopólio do Google
Em agosto de 2024, o juiz Amit Mehta concluiu: o Google é, sim, um monopólio no mercado de buscas.
“Após considerar cuidadosamente os depoimentos e evidências, o tribunal conclui que o Google é um monopolista e agiu como tal para manter seu monopólio”, declarou Mehta.
E agora? Fase de medidas corretivas
Com o julgamento quase encerrado, o processo entrou na chamada “fase de remédios” (Remedies phase), iniciada em abril. O objetivo é definir quais ações o Google precisará tomar para restaurar o equilíbrio do mercado e abrir espaço para a concorrência.
Nesta sexta-feira (30), advogados da gigante e do DOJ fizeram a argumentação final. Enquanto o órgão público defendeu que a big tech é "máquina de monopólio que se retroalimenta", o representante da empresa alegou que as possíveis propostas de mudança são "invasivas" e que não há provas de que rivais se beneficiariam da ausência de certos acordos.
Após a sessão, o juiz Amit Mehta deve convocar o tribunal novamente apenas para comunicar a decisão e as propostas de mudança — o que pode acontecer por volta de agosto deste ano, segundo o cronograma inicial.
O que o Departamento de Justiça propõe?
A proposta inicial do DOJ é bastante ampla — e drástica. Além de proibir acordos de exclusividade, o Google teria que vender o navegador Chrome. Outras medidas incluem:
- Proibição total de acordos que priorizem ou garantam exclusividade ao Google em dispositivos ou sistemas de terceiros;
- Fim da exigência do Google como buscador padrão como condição para distribuição de apps na Play Store;
- Venda integral do Chrome e do Chromium, sua base de código aberto;
- Fim do tratamento especial do buscador em outros produtos do ecossistema;
- Implementação de um sistema de sindicância que compartilhe dados de busca em tempo real com concorrentes.
O Google rebateu as propostas dias depois, dizendo que são “extremamente amplas” e podem prejudicar os consumidores. A empresa alega que as mudanças colocariam em risco a privacidade e a segurança dos usuários, além de comprometer a qualidade de seus produtos.
O que o Google propõe?
Como alternativa, o Google sugeriu soluções mais brandas — e descartou completamente a ideia de vender o Chrome. A proposta da empresa inclui:
- Manter os acordos de buscador padrão, mas com mais flexibilidade: por exemplo, celulares Android usam Google, enquanto iPhones usam Bing;
- Permitir que fabricantes de celulares incluam mais de um buscador padrão, mesmo com a presença de apps do Google ou do Chrome.
Essas medidas abririam os contratos, mas o Google ainda poderia pagar para continuar como padrão. Além disso, os desenvolvedores de navegadores teriam a opção de rever seus contratos anualmente.
Todo mundo de olho no Chrome
A possível venda do Chrome chamou atenção de grandes nomes do setor. Entre os interessados estariam a OpenAI, dona do ChatGPT, e o Yahoo.

Quem adquirir o Chrome também levaria o Chromium, a base usada por navegadores como Microsoft Edge e Opera — ou seja, um pacote de peso.
Concorrentes argumentam que as medidas do governo abririam espaço para produtos equivalentes, incentivando a inovação.
Não é tão simples assim
Desvincular o Chrome do Google, no entanto, teria impactos profundos no setor. O navegador é líder de mercado e, ironicamente, financia rivais — como o Firefox. Hoje, 85% da receita da Mozilla vem de acordos com o Google, e 90% do lucro da fundação é gerado pelo navegador, segundo Eric W. Muhlheim, CFO da Mozilla.
A Perplexity, criadora de um buscador rival baseado em IA, também é contra a cisão. “Fabricantes e operadoras devem oferecer aos clientes o que quiserem, sem medo de penalidades ou restrições”, declarou. “Sem isso, o risco é claro: o Google continuará gastando mais que todos para se manter como padrão — mesmo que alguém crie um produto melhor.”
O que muda pra você?
O Google faz parte do DNA da internet. Mais do que um buscador, ele comanda um ecossistema poderoso, com produtos como o Chrome dominando mercados há anos — inclusive financiando seus próprios concorrentes.
Se o navegador for vendido, tudo pode mudar. A nova gestão poderia adotar rumos diferentes, o que afetaria a integração com o restante dos serviços Google — hoje, um dos maiores atrativos do Chrome.

A identidade do navegador também pode ser alterada com o tempo, dependendo da visão de quem assumir. E projetos baseados no Chromium podem ser diretamente impactados, caso o novo dono não tenha o mesmo compromisso com sua continuidade.
No Brasil, o caso também pode ecoar. A advogada Patrícia Peck, especialista em Direito Digital e CEO da Peck Advogados, afirma que o desfecho pode servir como “precedente estratégico” e influenciar decisões nacionais.
Seja qual for a decisão final, ela só será anunciada em setembro — e o Google já prometeu recorrer. Os efeitos práticos, no entanto, podem levar anos para aparecer — mas não se engane: o impacto dessa disputa será sentido por todo mundo que navega, pesquisa ou consome conteúdo na internet.
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Especialista em Redator
Redator de tecnologia desde 2019, ex-Canaltech, atualmente TecMundo e um assíduo universitário do curso de Bacharel em Sistemas de Informação. Pai de pet, gamer e amante de músicas desconhecidas.